Governo de Fujimori Executou Duzentas Mil Esterilizações Forçadas no Peru in Público
Quinta-feira, 25 de Julho de 2002

Indígenas pobres das zonas rurais foram os mais atingidos pela campanha

Sabia-se que as autoridades sanitárias peruanas ao tempo do Presidente Alberto Fujimori percorriam algumas das zonas mais recôndidas do país a esterilizarem pessoas sob vários pretextos. O que se desconhecia era a dimensão do que foi afinal uma campanha de contornos genocidas que está a causar um escândalo internacional.

De acordo com um relatório oficial apresentado ontem em Lima, funcionários de saúde governamentais esterilizaram durante o segundo mandato do dirigente prófugo mais de 200 mil mulheres e homens, sem o seu consentimento. O antigo chefe de Estado deixou inopinadamente o poder em Novembro de 2000, encontrando-se neste momento no Japão, que lhe concedeu asilo político.

O documento foi apresentado pelo ministro peruano da Saúde, Fernando Carbone, que disse que o então Governo lançou mão de vários recursos para demover as pessoas, indígenas sobretudo, de tentarem ter mais filhos, fosse dando-lhes informações enganadoras sobre planeamento familiar fosse oferecendo-lhes comida ou, em desespero de causa, ameaçando-as com multas - a chantagem era comum.

Os indígenas, principalmente os das áreas rurais, foram a parte da população mais atingida. O plano subiu no entanto os Andes, onde, segundo o ministro, citado pela BBC "online", se registaram também muitas vítimas.

Carbone acusou Fujimori e muitos dos seus ministros de "procedimentos incorrectos" e de "violações de direitos humanos", apelando a uma profunda investigação dos factos e, havendo lugar a ela, à responsabilização criminal dos envolvidos.

De acordo com número libertados em Lima, equipas de cirurgiões percorreram, entre 1996 e 2000, regiões tão longínquas quanto pobres esterilizando 215.227 mulheres e 16.547 homens (vasectomias). A operação nestes quatro anos tomou o aspecto de uma verdadeira campanha, considerando que nos três anos anteriores o número de mulheres esterilizadas foi de 80.385 e o de homens 2.795.

As intervenções cirúrgicas resultaram de uma campanha "enganosa", quer dizer de desinformação acintosa, através de publicidade que incluiu panfletos, "posters" e anúncios radiofónicos, com palavras como "felicidade" e "bem-estar" manipuladas de forma a convencer a população.

Mas não é tudo: os técnicos não fizeram nem avaliações clínicas rigorosas antes das intervenções nem tomaram todas as precauções necessárias em matéria de anestesia.

Cinco centenas de pessoas, das regiões de Cuzco e Ancash, testemunharam no relatório. Só 10 por cento delas disseram ter dado o seu "consentimento" às intervenções de que foram objecto. Outras afirmaram ter recebido incentivos, por exemplo alimentares, para se deixarem esterilizar.

A esterilização forçada de indígenas no Peru não é em si mesma uma novidade. Era conhecida. Ciclicamente, a televisão peruana refere-se ao assunto e apresenta depoimentos. Mas não havia um relatório oficial sobre o assunto.

O documento foi tornado público um dia depois de o Presidente Alberto Fujimori e três dos seus antigos ministros terem sido acusados em Lima por uma comissão parlamentar de "traição", devido a vários delitos económicos e financeiros entre 1990 e 2000. F.S.

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