Diário Digital - 16 Set 03
A informalidade
Hermínio Santos
A palavra é extensa e não existe no dicionário. O adjectivo que lhe dá
origem - informal - significa, entre outras coisas, «desprovido de
formalidades», «não oficial», «à vontade», «descontraído». Na terça-feira,
ficámos a saber que a informalidade é o principal obstáculo que se levanta
ao crescimento da produtividade em Portugal. A conclusão é da McKinsey,
que a escreve num relatório divulgado em Lisboa e encomendado pelo Governo
português. Mas o que é afinal essa informalidade? Tudo se resume a
uma palavra: evasão. É que a McKinsey diz no mesmo relatório que a
informalidade aplicada à produtividade caracteriza-se por comportamentos
que se traduzem em evasão fiscal, evasão a obrigações sociais e evasão a
normas de mercado.
Ou seja, há um grupo de empresas e indivíduos em Portugal que faz tudo o
que pode para não pagar impostos, não pagar salários mínimos, evitar
pagamentos à segurança social e passar ao lado de exigências ambientais,
direitos de propriedade e normas de segurança.
O que a McKinsey fez foi dar um enquadramento tecnocrático e científico ao
chico-espertismo português, velha tradição lusa e um comportamento muito
apreciado em alguns sectores do País mas que definitivamente não nos
levará a lado nenhum. É que a informalidade falseia a concorrência, torna
as empresas menos eficientes, estimula as más práticas empresariais e
afecta o espírito de inovação.
Depois de 48 anos de ditadura e quase 30 após o 25 de Abril, grande parte
da sociedade portuguesa continua a cultivar o espírito do expediente e do
chico-espertismo para resolver os problemas do dia-a-dia e que tem feito
história ao longo de várias gerações.
Com isso só tem conseguido de facto resolver os problemas de curto-prazo,
mas agora, que as exigências comunitárias e mundiais são outras, começa a
estar em causa o próprio futuro e a identidade do País. Erradicar a
informalidade - aquela que impede o aumento da produtividade, não aquela
que torna saudáveis, nos momentos próprios, as relações pessoais e
profissionais - é uma tarefa que ultrapassa os Governos. É um desafio a
toda a sociedade.
A McKinsey sugere no relatório que Portugal siga o exemplo espanhol no
combate à informalidade. Isso mesmo, a Espanha, a velha rival. Diz a
consultora que os espanhóis racionalizaram o sistema fiscal e os
mecanismos de auditoria, aumentaram as penalizações no caso das evasões
fiscais e - pormenor importante - reforçaram a «consciencialização da
opinião pública e empresarial para a importância do cumprimento». |