"Quem quer muito ter um filho pensa: 'Tudo se
resolve'" Andreia Sanches
Há sempre lugar para mais um, arranjar-se-á sempre
maneira de sustentar mais uma criança. É esta a
convicção de Madalena Pinto, de 40 anos. Vive em
Oeiras, tem nove filhos, está grávida do décimo.
"Ser mãe é um dom", dizia ontem, a meio de mais um
dia como tantos outros: superpreenchido. O filho
mais velho tem 15 anos, o mais novo 19 meses.
Madalena formou-se em Economia, trabalhava num
banco, mas decidiu ficar em casa quando nasceu a
segunda criança. À medida que a família foi
crescendo, foi preciso ir reorganizando o orçamento
familiar, até porque havia um salário a menos.
"Corta-se nos cinemas, nos jantares fora de casa,
nos espectáculos, nos brinquedos, nos telemóveis...
nas actividades extracurriculares... Mas acho que
eles têm tudo o que realmente precisam." O marido é
vendedor de brindes e os abonos de família de cada
criança, somados, rendem à volta de 400 euros
mensais. "Se lhe dissesse qual é, no total, o
orçamento que temos para gerir surpreender-se-ia."
Não diz qual é. Diz só que é preciso fazer alguma
ginástica. E que a alimentação vem sempre em
primeiro lugar.
Madalena foi uma das seis mães a quem o PÚBLICO
perguntou o que é que se pondera quando se decide
ter um filho. Susana, de 31 anos, Gabriela, 34,
Marina, 30, Raquel, 32, e Joana, também 30, têm em
comum o facto de terem sido mães em 2008.
Decidiram ter filhos num ano que ficará para a
história marcado pela crise financeira, pelo
fantasma da recessão e do desemprego. "Acho que não
há nenhum casal que não pense nisso", diz Susana
Peralta, duas crianças, a mais nova com três
semanas.
Mas quase todas garantem que as despesas de mais uma
boca para alimentar são aquilo em que menos se pensa
na hora de aumentar a família. "Acho que é sobretudo
uma questão emocional. O que realmente pesa na opção
dos casais é o desejo, a vontade. Se querem muito
ter um filho, então pensam: 'Tudo se resolve'", diz
Joana Miranda, investigadora científica em Lisboa,
mãe de Beatriz, uma menina com um mês, a sua
primeira filha. "Acho, aliás, que quem tem mais
dinheiro faz mais contas, porque quer manter um
certo nível de vida."
"No nosso caso, sempre foi tudo planeado e achamos
que agora era oportuno ter o segundo filho", diz
Susana, uma gestora de economato numa instituição
particular de solidariedade social casada com um
informático que trabalha por conta própria. "Achámos
que tínhamos a nossa vida controlada, que tínhamos
feito algumas poupanças para enfrentar imprevistos e
avançámos. Mas creio que o mais importante é que o
casal tenha estabilidade, que haja cumplicidade para
fazer face às exigências de ter um filho. Não é
preciso ter casa própria" ou um ordenado chorudo.
Já Raquel Rodrigues, bióloga, diz que o que mais
pesou na decisão de ter o André agora (ele acaba de
fazer seis meses) foi o facto de "ter a vida
arrumada". Terminou o doutoramento, comprou casa,
estava com 30 anos, era o timing que tinha planeado
para ter um filho. "Estava na hora." E à sua volta,
entre colegas e amigas, algo parecido ter-se-á
passado: mulheres na casa dos 30 esperaram por
"arrumar a vida", foram adiando a maternidade. Até
agora. "Conheço muitas que foram mães recentemente."
Gabriela, de 34 anos, e João, de 36, ela jornalista,
ele criativo numa agência de publicidade, fazem
parte do grupo. Vicente nasceu há 20 dias. E os pais
estão a habituar-se a tudo: não sabem ao certo qual
é o preço de um pacote de fraldas; já perceberam que
as despesas com a água e a luz vão disparar, tal é a
quantidade de roupa que passaram a lavar; o único
"estudo" que procuraram fazer com antecedência foi
no "mercado" das creches. E já sabem que vão pagar
uma mensalidade de cerca de 400 euros por aquela que
escolheram. "De resto, não fizemos contas. Sei que
estamos numa situação privilegiada. Temos uma
situação profissional estável, ordenados razoáveis,
um empréstimo para pagar", mas sem apertos, diz
Gabriela. "Tenho noção que nesta altura muitas
pessoas que querem ter filhos têm mais
dificuldades." E quando se fala tanto da necessidade
de fomentar a natalidade "seria muito importante que
existissem mais infantários públicos", onde não
fosse preciso gastar centenas de euros.
Aumentar os abonos de família não chega, diz também
Marina Aldeias. "Para uma família com dificuldades,
não faz assim tanta diferença", diz esta formadora
numa operadora de telemóveis. Tem um filho com cinco
anos e uma menina com sete meses. "Pelo Afonso
recebo cerca de 28 euros por mês." Não será isso que
estimulará as pessoas a terem mais filhos, acredita.