Presidente Cavaco Silva chama a
um novo olhar sobre a escola
Criar vontade de vencer e apego ao trabalho
João Vaz / D.A
"Não basta adquirir livros e manuais, assistir de
quando em quando a reuniões de pais ou transportar
diariamente os filhos à escola”, alertou ontem o
Presidente Cavaco Silva nas comemorações do 5 de
Outubro, debaixo da varanda onde a República foi
proclamada em 1910. Num discurso consensual, sentido
pelo primeiro-ministro como incentivo à acção do
Governo e agradecido pelos sindicatos devido às
“referências elogiosas” ao papel dos professores, o
Presidente destacou que “há toda uma cultura de
autoexigência que deve ser estimulada pelos pais” e
acrescentou ao discurso escrito o papel formador da
escola na “vontade de vencer e apego ao trabalho”.
A educação foi de forma justificada o tema da
comemoração da República. Afinal, como afirmou o
presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, o
regime mostrou as suas prioridades ao avançar em
Março de 1911 com uma reforma educativa que
descentralizou “para os municípios as competências
relativas ao então ensino primário infantil e
elementar”. Podia também evocar os centros escolares
republicanos dos quais quase cem anos depois ainda
há uma dúzia a funcionar. Dois deles estavam
representados com as suas bandeiras na placa central
da praça e fizeram-se notar com um ‘Viva a
República!’ logo após o hastear da bandeira
nacional.
Na Praça do Município, de Lisboa, estiveram
numerosas individualidades e duas a três centenas de
populares entre militantes republicanos, curiosos e
turistas estrangeiros. António Costa, eleito em
Julho, afirmou-se orgulhoso de ser pela primeira vez
anfitrião das comemorações que reuniram os mais
altos dignatários do Estado. O Presidente Cavaco
Silva teve a seu lado Jaime Gama, presidente da
Assembleia da República, e o primeiro-ministro, José
Sócrates. Num palanque à esquerda, além dos
presidentes dos supremos tribunais sentaram-se
quatro ministros, Teixeira dos Santos, Severiano
Teixeira, Nunes Correia, Mário Lino e Correia de
Campos, sendo o detentor da pasta do Ambiente a
única excepção à moda das gravatas encarnadas
liderada pelo primeiro-ministro. Na bancada maior, à
direita, os vereadores da Câmara ocupavam a primeira
fila e entre eles via-se o grande-mestre do Grande
Oriente Lusitano, António Reis.
PEDIDA "EFICÁCIA NA LUTA CONTRA A CORRUPÇÃO"
O Presidente da República lembrou na fase inicial da
sua intervenção do 5 de Outubro que no ano passado
enaltecera “a dimensão ética da cultura republicana
e as exigências daí decorrentes, nomeadamente no que
diz respeito à responsabilização dos titulares de
cargos públicos e ao combate à corrupção”.
Em jeito de balanço, registou que “na Assembleia da
República foram apresentadas múltiplas iniciativas
legislativas visando aumentar a eficácia da luta
contra a corrupção” e não se eximiu a novo desafio:
“Apelo a que os senhores deputados aprofundem o
esforço já empreendido para concretizar, no plano
legislativo, o ideal republicano de uma maior
transparência da vida pública.”
FRASES EM DESTAQUE
"Ao fim de quase um século de existência, temos de
reconhecer que a República não conseguiu resolver
aquela que é a principal causa do nosso atraso
estrutural: as deficiências na educação das crianças
e dos jovens. "
Cavaco Silva
"Um levantamento rigoroso e exaustivo do estado das
nossas 150 escolas do 1.º Ciclo e
jardins-de-infância da rede pública da cidade de
Lisboa mostrou-nos que só quatro por cento podem ser
consideradas como escolas de qualidade. De facto, 44
dos 90 estabelecimentos do 1.º Ciclo estão mesmo em
muito mau estado de conservação."
António Costa
"O Governo não ataca os professores, ataca os
problemas da Educação. E é preciso que não se
confunda professores com sindicatos."
José Sócrates
"Nas minhas visitas pelo País, tenho detectado
sinais positivos de mudança."
Cavaco Silva idem
"A IGONRÂNCIA É QUE É CARA"
“Os que acham que se gasta muito na Educação deviam
tentar a ignorância. A ignorância é que é cara”,
salientou o primeiro-ministro, José Sócrates, ao
falar com os jornalistas no final das comemorações
do 5 de Outubro, na Praça do Município. Sócrates
considerou o discurso do Presidente da República
“uma palavra de incentivo para o Governo” e
distinguiu entre professores e sindicatos para
explicar a sua concordância com o pressuposto
enunciado por Cavaco Silva quanto à necessidade de
“que a figura do professor seja prestigiada e
acarinhada pela comunidade”. Nesse sentido invocou o
facto de o Governo ter passado os contratos anuais
para a duração de três anos e garantir assim “a
estabilidade do corpo docente referida pelo
presidente. A Fenprof polemizou com as declarações,
insistindo na denúncia de que os professores não
maltratados pelo Governo.
LISBOA QUER QUALIFICAR ESCOLAS
Lisboa vai lançar um programa especial de
modernização e qualificação do Pré-Escolar e 1.º
Ciclo do Ensino Básico, a desenvolver entre 2008 e
2112, segundo anunciou no seu discurso o presidente
da Câmara, António Costa. O autarca registou uma
situação de degradação nos estabelecimentos de
ensino da capital e afirmou que “só uma escola
revalorizada e bem inserida no tecido urbano é capaz
de responder com sucesso às necessidade da
comunidade educativa. As crianças de Lisboa
exigem-no, os professores merecem-no e a
revitalização da cidade não permite qualquer
adiamento”, enfatizou. Com o centenário da República
à vista, disse que “a modernização e a qualificação
da Escola permitem afirmar a viva actualidade do
ideário da República e a satisfação de uma
necessidade dramática do presente”.
MENEZES SEM CONVITE PARA CERIMÓNIAS
Luís Filipe Menezes (na foto) afirmou ontem na TVI
que não recebeu convite para as cerimónias oficiais
da comemoração da República. Em consequência, o
partido não esteve oficialmente representado. Na
tribuna própria, só foram vistos os líderes
parlamentares do PCP e CDS. A Câmara garantiu que
enviou convite aos partidos parlamentares.
"PRESIDENTE AGRADECEU O MEU ALERTA"
“Não votei nele, mas este Presidente da República
acabou com a incorrecta atitude de Santana Lopes que
proibia o povo de assistir às comemorações do 5 de
Outubro”, contou ao CM Joaquim Neves, advogado de 74
anos que desde o 25 de Abril assiste sempre às
cerimónias oficiais na Câmara de Lisboa, mesmo sob
chuva impiedosa, mas entre 2002 e 2005, durante o
mandato de Santana Lopes, ficou à porta porque a
ordem era não deixar entrar o povo.
Ontem afirmou que achava óptimo o novo figurino das
comemorações transferidas para o exterior desde o
ano passado. “Eu escrevi uma carta ao Presidente da
República a lastimar a marginação das pessoas
anónimas que antes de 2002 tinham entrada livre e
tenho em casa uma resposta a agradecer o meu
alerta”, destacou, satisfeito com a atenção.
O 5 de Outubro é hoje muito diferente das agitadas
deposições de flores na estátua de António José de
Almeida e romagens aos mártires que jazem no
cemitério do Alto de São João. Antes do 25 de Abril,
esses actos eram sempre cenário de cargas policiais
porque a ditadura não gostava da República e ainda
menos que se gritasse “Viva a Liberdade!”
PORTUGAL EXISTE HÁ 864 ANOS
A Real Associação de Coimbra (RAC) assinalou ontem o
864.º aniversário de Portugal, reconhecido pelo
Tratado de Zamora, com missa na Igreja de Santa Cruz
e homenagem junto aos túmulos de D. Afonso Henriques
e de D. Sancho I. O presidente da RAC, Joaquim Nora,
disse que Portugal “deve ser o único País que não
celebra oficialmente a data da sua independência (5
de Outubro de 1143)”, preferindo “comemorar as datas
de acidentais alterações ao regime”.
PALÁCIO ABERTO
Milhares de pessoas fizeram ontem à tarde uma imensa
fila para visitar o Palácio de Belém, residência
oficial do Presidente da República, que lhes
preparou um programa cultural.