Diário de Notícias - 11 Out 06

Utentes vão pagar o dobro em taxas

Rute Araújo

 

O Ministério da Saúde vai quase duplicar as receitas provenientes das taxas moderadoras cobradas aos utentes no próximo ano, o que será feito através da criação das taxas de utilização - valores que passarão a ser cobrados para internamentos e cirurgias de ambulatório. Contas feitas, Correia de Campos quer arrecadar 16 milhões de euros.

"A criação de taxas de utilização vai permitir atingir, juntamente com as taxas moderadoras, 0,9% do orçamento [da Saúde]" de 2007, afirmou ontem o ministro Correia de Campos, durante o debate sobre o Orçamento de Estado na Comissão de Finanças da Assembleia da República, quando explicava aos deputados as dificuldades de fazer crescer as receitas do Serviço Nacional de Saúde (SNS)

Hoje, as taxas moderadoras representam 0,5% das receitas do SNS, revertendo em cerca de oito milhões de euros. Um aumento desta percentagem para 0,9% permite ao Estado recolher perto de 16 milhões, o que representa o dobro das verbas actuais. Recorde-se que, há algumas semanas, Correia de Campos admitia que, para alguns dos serviços hoje livres de taxas, os doentes passariam a ter de pagar verbas de utilização.

Excluídos do pagamento das actuais taxas moderadoras estão os utentes de baixos rendimentos, os pensionistas, doentes crónicos, grávidas, crianças, etc. Mas, de acordo com os planos do Governo, as isenções às taxas moderadoras seguiriam estes moldes, mas também outros critérios. Os internamentos prolongados, por exemplo, também ficariam livres de taxas.

À saída da comissão, Correia de Campos remeteu quaisquer esclarecimentos sobre o assunto para a entrevista que vai dar a uma estação de televisão na quinta-feira.

As contas de 2006

De acordo com os dados apresentados pelo Governo, relativos às contas de Agosto - já fechadas -, o SNS regista um lucro de 336,2 milhões de euros, mas prevê-se que, no final do ano, desça para 35 milhões. O saldo positivo é explicado pelo secretário de Estado Francisco Ramos pelas dotações orçamentais mais "equilibradas", que representaram mais 25% em relação ao ano anterior, mas também pela contenção da despesa. Cortes no preço dos medicamentos e nas comparticipações e contenção do crescimento dos fármacos vendidos nas farmácias - que deverão crescer 0,9% em relação a 2006 - são algumas das explicações para os números apresentados. No caso dos gastos com medicamentos hospitalares, o secretário de Estado admitiu que a situação é diferente, até porque continua a não haver números fiáveis dos consumos.

Da oposição, surgiram críticas em relação às políticas seguidas de encerramento de serviços. "É preciso contar gorduras no SNS já há muito tempo, mas o que estão a cortar não é gordura mas músculo", afirmou Bernardino Soares, do PCP, enquanto João Semedo, do Bloco de Esquerda, disse temer "já estarmos no osso". O social-democrata Carlos Miranda acusou Correia de Campos de estar "refém do orçamento" e de avançar com medidas precipitadas para conter despesas.