Público - 05 Out 06

Prestações da casa mais caras levam a riscos de sobreendividamento

A subida das taxas levou a um aumento nas prestações mensais de pelo menos 15 por cento - um "apertar do cinto" significativo, num país endividado

Desde Dezembro do ano passado, a taxa directora do Banco Central Europeu (BCE) já subiu quatro vezes; deve subir outra vez hoje. Os aumentos do BCE têm impacte directo sobre as taxas Euribor, que são as indexantes de quase todo o crédito à habitação em Portugal.
Sobem as taxas, sobe a prestação mensal da casa. Numa simulação pedida pelo PÚBLICO à Deco (ver tabela abaixo), o impacte das subidas é notório. Num empréstimo mais ou menos típico (150 mil euros, prazo de 25 anos, spread de 0,8 pontos), a subida das taxas implicou, no lapso de um ano, um aumento de 110 euros na prestação mensal - ou 15,6 por cento.
Se as taxas subirem mais 0,5 pontos percentuais (um cenário relativamente provável no médio prazo), o aumento em relação ao cenário-base é de 21,6 por cento. E se houver um aumento de mais dois pontos (um cenário menos provável, mas concebível e com precedentes históricos), a prestação dispara 40,6 por cento em relação ao valor inicial.
Para as centenas de milhares de portugueses com crédito à habitação indexado, estes valores significam um "apertar do cinto" dramático. Sobretudo numa conjuntura em que a economia - e os salários - crescem muito pouco.
O endividamento dos particulares em Portugal representava 70 por cento do produto interno bruto (PIB) no final de 2005. Um valor que, no contexto europeu, não é especialmente alto. E, como o Banco de Portugal tem notado, o aumento do nível de endividamento é suportado pelo aumento no património das famílias (os particulares endividam-se sobretudo para comprar casa, e têm portanto esse valor na sua posse); os encargos com a dívida mantiveram-se mais ou menos estáveis na última década.
No entanto, a tendência dos níveis de endividamento e das taxas de esforço (a quantidade do rendimento dedicada a pagar os juros da dívida) é de crescimento. Ainda esta semana, a Comissão Europeia mostrou-se preocupada com o risco de sobreendividamento.
O gabinete comissário europeu para os Assuntos Monetários, Joaquín Almunia, divulgou dados "preocupantes": em seis países da zona euro os níveis de endividamento dos particulares estão acima dos 60 por cento do PIB.
A Comissão nota que "taxas de juro mais elevadas terão um impacte maior nas famílias que contraíram créditos a taxas variáveis", situação que "tende a ser predominante em Espanha, Irlanda, Itália, Finlândia e Portugal".
O que é que as pessoas podem fazer para se proteger? Essencialmente, procurar renegociar os seus empréstimos. Os bancos não querem que os seus clientes deixem de poder pagar a prestação - isso levaria os bancos a ter de executar a hipoteca, deixando-os com imóveis na mão.
Os bancos portugueses já estão a renegociar os seus créditos, aliás - sobretudo através da extensão dos prazos dos empréstimos. Isso explica que, nos dados mais recentes, as taxas homólogas de crescimento do crédito à habitação continuem na casa dos 10 por cento - não é tanto que haja muitos novos empréstimos, é mais que muitos créditos estão a ser alargados. É também isso que explica que o nível de créditos à habitação malparados tenha continuado muito baixo ao longo de 2006 (abaixo dos 2 por cento). P.R.