Prestações da casa mais caras levam a riscos de
sobreendividamento
A subida das taxas levou a um aumento nas
prestações mensais de pelo menos 15 por cento - um
"apertar do cinto" significativo, num país
endividado
Desde Dezembro do ano passado, a
taxa directora do Banco Central Europeu (BCE) já
subiu quatro vezes; deve subir outra vez hoje. Os
aumentos do BCE têm impacte directo sobre as taxas
Euribor, que são as indexantes de quase todo o
crédito à habitação em Portugal.
Sobem as taxas, sobe a prestação mensal da casa.
Numa simulação pedida pelo PÚBLICO à Deco (ver
tabela abaixo), o impacte das subidas é notório. Num
empréstimo mais ou menos típico (150 mil euros,
prazo de 25 anos, spread de 0,8 pontos), a subida
das taxas implicou, no lapso de um ano, um aumento
de 110 euros na prestação mensal - ou 15,6 por
cento.
Se as taxas subirem mais 0,5 pontos percentuais (um
cenário relativamente provável no médio prazo), o
aumento em relação ao cenário-base é de 21,6 por
cento. E se houver um aumento de mais dois pontos
(um cenário menos provável, mas concebível e com
precedentes históricos), a prestação dispara 40,6
por cento em relação ao valor inicial.
Para as centenas de milhares de portugueses com
crédito à habitação indexado, estes valores
significam um "apertar do cinto" dramático.
Sobretudo numa conjuntura em que a economia - e os
salários - crescem muito pouco.
O endividamento dos particulares em Portugal
representava 70 por cento do produto interno bruto (PIB)
no final de 2005. Um valor que, no contexto europeu,
não é especialmente alto. E, como o Banco de
Portugal tem notado, o aumento do nível de
endividamento é suportado pelo aumento no património
das famílias (os particulares endividam-se sobretudo
para comprar casa, e têm portanto esse valor na sua
posse); os encargos com a dívida mantiveram-se mais
ou menos estáveis na última década.
No entanto, a tendência dos níveis de endividamento
e das taxas de esforço (a quantidade do rendimento
dedicada a pagar os juros da dívida) é de
crescimento. Ainda esta semana, a Comissão Europeia
mostrou-se preocupada com o risco de
sobreendividamento.
O gabinete comissário europeu para os Assuntos
Monetários, Joaquín Almunia, divulgou dados "preocupantes":
em seis países da zona euro os níveis de
endividamento dos particulares estão acima dos 60
por cento do PIB.
A Comissão nota que "taxas de juro mais elevadas
terão um impacte maior nas famílias que contraíram
créditos a taxas variáveis", situação que "tende a
ser predominante em Espanha, Irlanda, Itália,
Finlândia e Portugal".
O que é que as pessoas podem fazer para se proteger?
Essencialmente, procurar renegociar os seus
empréstimos. Os bancos não querem que os seus
clientes deixem de poder pagar a prestação - isso
levaria os bancos a ter de executar a hipoteca,
deixando-os com imóveis na mão.
Os bancos portugueses já estão a renegociar os seus
créditos, aliás - sobretudo através da extensão dos
prazos dos empréstimos. Isso explica que, nos dados
mais recentes, as taxas homólogas de crescimento do
crédito à habitação continuem na casa dos 10 por
cento - não é tanto que haja muitos novos
empréstimos, é mais que muitos créditos estão a ser
alargados. É também isso que explica que o nível de
créditos à habitação malparados tenha continuado
muito baixo ao longo de 2006 (abaixo dos 2 por
cento). P.R.