Público - 17 Out 03

Papa Quer Bispos Empenhados na Ecologia, Saúde e Direitos Humanos
Por ANTÓNIO MARUJO

O Papa quer os 4695 bispos da Igreja Católica empenhados na promoção do diálogo inter-religioso, na defesa do ambiente, saúde e apoio aos migrantes. Na exortação pastoral "Pastores gregis" (Os pastores do rebanho), ontem assinada no Vaticano, João Paulo II pede aos bispos que sejam factores de esperança num mundo carregado de problemas. Diante das situações de injustiça, diz o texto, "o bispo é o defensor dos direitos do homem". "Não há dúvida que a doutrina social da Igreja é capaz de suscitar esperança mesmo nas situações mais difíceis, porque, se não houver esperança para os pobres, não a haverá para ninguém, nem mesmo para os chamados ricos."

Os bispos devem também ser anunciadores da "doutrina moral da Igreja, em defesa do direito da vida, desde a concepção até ao seu termo natural", e também do pensamento social católico, "cujo fundamento está no Evangelho, e toma a peito a defesa de quem é débil, dando voz a quem a não tem para fazer valer os seus direitos".

No último capítulo do documento, dedicado aos desafios actuais da missão dos bispos, o Papa Wojtyla diz que os bispos devem ver-se como "profetas da justiça". "A guerra dos poderosos contra os débeis tem aberto, de dia para dia, profundas divisões entre ricos e pobres. Os pobres são inúmeros! Dentro dum sistema económico injusto, com discrepâncias estruturais muito acentuadas, os marginalizados sentem a sua situação agravar-se de dia para dia. Em muitas partes da terra, hoje grassa a fome, enquanto noutras há opulência. E as vítimas destas dramáticas desigualdades são sobretudo os pobres, os jovens, os refugiados. Também a mulher, em muitos lugares, é vexada na sua dignidade de pessoa, vítima duma cultura hedonista e materialista."

O texto papal condena, insistindo em argumentos referidos no Sínodo, o terrorismo, os "males endémicos subestimados por demasiado tempo", o "drama persistente da fome e da pobreza extrema", a opressão política ou a "discriminação económica". Também lamenta - "o catálogo não é completo" - "os desastres causados pela malária, o aumento da sida, o analfabetismo, a falta de um futuro para numerosas crianças e jovens abandonados na rua, a exploração das mulheres, a pornografia, a intolerância, a instrumentalização inaceitável da religião para finalidades violentas, o tráfico de drogas e o comércio de armamentos".

Do quadro descrito, o Papa insiste na "óbvia urgência" do "apelo e compromisso pela paz" e na condenação dos "fundamentalismos religiosos, sempre inimigos do diálogo e da paz". "Em muitas regiões do mundo, a terra mais parece um paiol, pronto a explodir causando na família humana enormes sofrimentos", escreve João Paulo II.

Para enfrentar estes problemas, os bispos devem promover o diálogo inter-religioso para "superar as divisões e favorecer a recíproca amizade e o respeito entre os povos". Não podem faltar com a sua atenção às "pessoas mais pobres e abandonadas" das sociedades, promovendo uma "globalização da caridade" - e "considerando neste mesmo contexto as questões relativas ao perdão da dívida pública externa, que compromete as economias de populações inteiras, travando o seu progresso social e político", uma insistência do Papa desde há anos.

Também a "salvaguarda da criação e dos recursos da terra" levanta problemas éticos a que os bispos devem estar atentos. Está em causa também uma "ecologia humana, que proteja o bem radical da vida em todas as suas manifestações e prepare para as futuras gerações um ambiente o mais próximo possível do projecto do Criador". Os bispos devem agir ainda na promoção da "cultura da vida" e na criação de "estruturas pastorais concretas para o acolhimento" dos imigrantes.

No documento, João Paulo II fala ainda da necessidade de ser "forte e decidido, justo e sereno" em casos de "falta grave" cometidos por padres, numa frase que não se pode deixar de ler como uma referência aos casos de pedofilia que abalaram recentemente o catolicismo norte-americano. "Intervir com prontidão", para corrigir o erro, restabelecer a justiça e proteger as vítimas são as obrigações do bispo nestes casos.

A exortação mantém a doutrina tradicional da Igreja Católica sobre a relação dos bispos locais com o Papa, apresenta os fundamentos bíblicos do episcopado e pede que os prelados católicos não se limitem a "um papel meramente organizativo ou burocrático". Este documento, publicado no dia em que se assinalavam 25 anos do início do pontificado de João Paulo II, resulta da décima assembleia do Sínodo dos Bispos, que se realizou em Outubro de 2001, no Vaticano, com o tema "O bispo ministro do Evangelho de Jesus Cristo para a esperança do mundo". A versão portuguesa do documento está disponível na íntegra em www.ecclesia.pt.

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