Diário de Notícias - 14 Out 03
Comissão independente para avaliar os manuais
MARIA JOSÉ MARGARIDO SOFIA JESUS *
O Ministério da Educação deve criar uma comissão independente a que os
autores poderão submeter livremente os seus manuais. Nenhuma escola
escolhe livros que não foram certificados quando pode seleccionar manuais
a partir de um conjunto apreciado por essa comissão». A proposta é do
deputado socialista e ex-ministro da Educação Augusto Santos Silva, depois
da chuva de críticas motivada pela inclusão do regulamento do concurso Big
Brother no manual «Comunicar» de Língua Portuguesa do 10.º ano, da Porto
Editora.
Em declarações ao DN, Augusto Santos Silva rejeita as responsabilidades do
anterior Governo socialista na matéria, esclarecendo que «o novo programa
de Português do ensino secundário foi aprovado porque cumpria todos os
pressupostos, tendo sido antecedido de muita discussão». O facto de se
tentar levar para as aulas textos e matérias da vida quotidiana «não se
compadece com a legitimação de um programa como o Big Brother, que é o
contrário do que deve ser a educação». Segundo o deputado socialista, essa
prática pode ser facilmente executada recorrendo-se «ao texto de um jornal
de referência, por exemplo. Fiquei horrorizado com a ideia de um manual
daqueles poder ser utilizado».
No entanto, e ao que o DN apurou, o Ministério da Educação não tem planos
imediatos para criar qualquer comissão independente de avaliação da
qualidade dos livros escolares, embora esta seja uma ideia recorrente no
discurso político _ tanto do actual como do anterior Governo. Augusto
Santos Silva reconhece que a matéria «é difícil», mas defende que «é
intolerável a actual situação dos manuais e a quantidade de erros que
contém». Daí a sugestão de criação de um júri independente, porque «não se
pode ir contra a economia de mercado nem limitar a liberdade de edição e
de autoria».
Augusto Santos Silva assume esta sugestão em nome individual, mas não
descarta a possibilidade de vir a ser apresentada como uma proposta
socialista. O Partido Popular (PP) já manifestou a intenção de submeter à
aprovação da Assembleia da República um projecto que fixa um número mínimo
de manuais, para limitar a sua proliferação.
A polémica estalou quando o jornal Público noticiou a análise crítica de
alguns manuais do 10.º ano de Português B, feita pela professora Maria do
Carmo Vieira, docente da mesma disciplina na Escola Secundária Marquês de
Pombal, em Lisboa, e enviada ao Ministério da Educação. Entre estes está o
livro mais controverso de todos, onde surge o regulamento do Big Brother,
com fotografias dos ex-concorrentes. Propõe-se aos alunos que refiram o
que conhecem sobre o concurso e elaborem um parecer sobre o mesmo.
«O manual cumpre o programa». Vasco Teixeira, administrador da Porto
Editora, não tem dúvidas. E diz mesmo que é normal que os autores destes
livros escolares «façam experiências pedagógicas. O concurso existe, está
na televisão e é bom que os alunos conheçam o regulamento». Vasco Teixeira
diz ainda que «algumas dezenas de escolas» adoptaram o referido manual».
«Só os professores que quiserem é que pegam nisso: não são obrigados a
seguir o manual à risca». Edviges Ferreira, da Associação de Professores
de Português, diz que estes exercícios «vão ajudar a explicar a distinção
entre o bom e o mau, desde que se fale sobre os aspectos negativos dos
programas». E «é uma motivação para os alunos participarem».
* Com João Pedro Oliveira
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