Público - 3 Out 03

Crianças Mais Sensíveis à Violência nos Noticiários do Que na Ficção
Por ANA RIBEIRO RODRIGUES

As crianças sentem-se mais perturbadas pelas imagens de violência veiculadas nos noticiários do que pela violência ficcionada e conseguem distingui-las. É este o resultado de um estudo divulgado na semana passada e realizado pela British Board of Film Classification (BBFC), pela estação pública britânica BBC, pela Broadcasting Standards Commission (BSC) e pela Independent Television Commission (ITC).

A análise incidiu nas reacções de crianças entre os nove e os 13 anos perante imagens de violência na televisão e no cinema. Paul Bolt, director da BSC frisa, numa informação à imprensa consultada pelo PÚBLICO, que "a pesquisa mostra que os pré-adolescentes mostram uma grande compreensão sobre o que consideram violento e do que a violência significa para elas". As crianças consideram uma imagem tanto mais violenta quanto mais injusto entendem ser o acto de violência e quanto mais espelharem situações das suas próprias vidas.

O estudo permitiu também concluir que as imagens de situações reais de violência são as que mais afectam as crianças, sobretudo se as consequências envolverem outras crianças ou pessoas e locais com que se identifiquem. E as consequências físicas, caso existam, aumentam esse impacto na maioria dos casos. Em certas circunstâncias os gritos podem igualmente ser vistos como uma forma de violência. Para aferir os factores que tornam a cena mais violenta os mais jovens têm também em conta a relação entre o agressor e a vítima e o ambiente em que acontece. Se for num local que reconheçam ou que considerem seguro, como um hospital ou em casa, torna-se mais ameaçador do que quando ocorre num local fantasiado, e a perturbação intensifica-se.

Há também o perigo de os menores sentirem medo e ansiosos, porque, ao verem imagens de cariz violento nos noticiários, ficam com a ideia de que aquilo lhes poderia ter acontecido. As crianças acabam por ser menos sensibilizadas por notícias de acontecimentos mais distantes ou que retratem momentos do quotidiano diferentes dos seus. Elas armazenam as imagens de violência que vêem, e as suas reacções são influenciadas pela idade, sexo, maturidade e circunstâncias pessoais. No capítulo da disponibilidade para ver imagens violentas o número de rapazes é superior ao sexo feminino, especialmente se não se sentirem pessoalmente ameaçados pelas imagens apresentadas.

Os promotores da análise concluíram também que os menores pré-adolescentes sentem maior conforto e segurança quando assistem a cenas de violência em casa, quando comparado com a ampliação das imagens e som no cinema, que criam um maior envolvimento. Se se criar um ambiente que transmita isolamento, como as pessoas estarem sozinhas ou não terem como fugir de uma situação, as crianças têm uma reacção mais forte.

Comparando com um estudo semelhante feito em 1999 com adultos, percebe-se que as reacções das crianças às imagens violentas reflectem a visão egocêntrica que têm do mundo. Isto porque, segundo os responsáveis pelo estudo, reagem de forma veemente quando as imagens lhes sugerem que não podem controlar o que acontece ou quando as pessoas em quem confiam não as podem proteger. Para além da atenção já referida que dispensam às consequências, o estudo revela que as crianças têm mais tendência que os adultos a julgar as cenas de violência de acordo com o seu estatuto moral, mais do que simplesmente com base no que é mostrado.

Paul Bolt deixa ainda o recado: "Ao editar os seus conteúdos para crianças os responsáveis por filmes e programas devem ter em conta os factores que as crianças consideram particularmente assustadores e violentos".

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