Público - 28 Nov 06

Tubinhos

Eduardo Prado Coelho o fio do horizonte

 

Eu vou contar tudo com o adequado pormenor. Tinha umas análises de sangue para tirar. Fui aos serviços fazer a respectiva marcação. Aí disseram-me que fosse em determinado dia, pelas 8 da manhã. Como tenho a obsessão da pontualidade, por volta das 7h45 já eu lá estava. Fui buscar a primeira senha desse dia, em que elas iriam abundar, e esperei. Até que o meu número apareceu numa voz mais ou menos sedutora.
Dirigi-me à jovem que estava ao balcão, que teve a habilidade de me dizer que eu precisava de ter uns tubinhos, que por acaso não existiam ali. Dei a volta ao edifício, e uma senhora que suponho que era enfermeira explicou-me que para ter os tais tubinhos eu deveria dirigir-me a um edifício amarelo que ficava perto do quiosque (onde não podia entrar, porque devia estar em jejum). Aí, nessas recordações da casa amarela, fui atendido por uma senhora extremamente simpática que me disse que os tubinhos se obtinham indo ao edifício ao lado e ela própria me atenderia para me conduzir ao local onde os tubinhos me seriam oferecidos. Assim foi. Lá nos dirigimos nós a uma sala onde um técnico olhou para o papel que eu transportava desde o raiar da aurora e foi buscar os respectivos tubinhos. Evitei assim a necessidade de ser acompanhado por uma verdadeira multidão que naquela sala, de senha na mão, esperava com santa resignação que o seu número surgisse no placard. Lá fui de tubinhos na mão, mais uns papéis de dimensão administrativa, até ao local onde entrara às 8 da manhã. Pedi uma nova senha. Chegado ao balcão, fui atendido por uma jovem que, perante a minha interrogação sobre o perturbante destino dos tubinhos, declarou: "O senhor está muito impaciente." Ana Cristinade seu nome. Pegou nos meus papéis e agarrou-se febrilmente ao computador. O seu rosto por vezes franzia-se no olhar como quem encontra uma terrível dificuldade. Temi o pior. Pôs-se a escrever, a avançar com números, até que se mostrou mais aliviada e me devolveu papéis e tubinhos e informou-me que deveria ir pelo corredor à esquerda e entrar na sala número 3. Aí uma senhora, que era o cúmulo da simpatia, esteve um bom bocado a extrair sangue que distribuiu pelos repectivos tubinhos. Disseram-me então que fosse ao edifício que ficava ao lado da casa amarela, onde continuava uma verdadeira multidão de senha amarrotada na mão triste. Aí pude ir a uma sala e dar a um senhor chamado "técnico" os respectivos tubinhos. Já não eram 8h da manhã, mas sim 10h e meia. Como o tempo passa e como nós nos distraímos de tubinhos na mão!
Restava-me atravessar o pátio das urgências e esperar por um táxi.
Confesso que, se as coisas fossem mais desembaraçadas, conseguiríamos menor cansaço e maior felicidade. Mas as coisas são como são. E um tubinho é a coisa mais bela deste mundo. Professor universitário