Expresso- 11
Nov 06
O aborto e a raiz
do problema
Pedro Afonso
Qualquer
texto ou
artigo de opinião
sobre o aborto gera
habitualmente no
leitor, em
função da sua
convicção sobre o
assunto, uma
identificação ou uma
rejeição da posição
ideológica de
quem escreve. De
resto, já há
muito tempo
que este
tema é debatido na sociedade portuguesa,
por essa
razão os argumentos de
ambos os lados
são bem
conhecidos.
Julgo
ainda que,
quer ganhe o “sim”
ou o “não” no novo
referendo
que se avizinha, pouca
coisa mudará. Ou seja,
o debate ideológico, embora
importante, tem que
ter uma repercussão prática, criando verdadeiras
soluções,
caso contrário
não irá servir para realmente
alterar as coisas.
Por outras palavras, a
raiz do problema
permanecerá!
É
relativamente consensual
entre os que defendem
a legalização do aborto
e
aqueles que se opõem,
de que o aborto –
independentemente das
circunstâncias em
que é realizado – é
algo de mau,
repugnante e de que
ninguém deverá orgulhar-se.
Mas o mais
importante é que
poderia ser evitado!
Então, se pode ser evitado,
por que é
que a maioria das
pessoas se fixa
obsessivamente na luta
ideológica e não
procura encontrar
soluções concretas?
Sem
pretender criar
estereótipos, sabemos
que muitas das
mulheres que abortam
fazem-no por
imaturidade,
maus-tratos, abusos
sexuais, solidão,
abandono, dificuldades
económicas, etc. Em
suma, fazem-no por
julgarem que
não têm outras opções.
A verdade é
que muitas mulheres
que abortam não têm
muitas alternativas.
Ficam
entregues a si
próprias, uma vez
que
a sociedade – salvo
honrosas excepções de algumas
instituições de
solidariedade social –
não lhes deu
grandes hipóteses de
escolha.
O
Estado tem uma
legislação específica
para este
assunto (Centros de
Apoio à Vida),
mas que hipocritamente
os governos
verdadeiramente
nunca fizeram aplicar.
Por outro
lado, aqueles
que procuram lutar
contra o aborto “pela
positiva”, estão desapoiados e
não dispõe de
estruturas suficientes
para fazer face
às reais
necessidades
desta calamidade.
Várias
mulheres que abortam
ficam assim num
beco
sem saída,
sem possibilidades de
opção, sem
apoio e, ao contrário
daquilo
que é dito, ficam
privadas da sua
liberdade. Ou seja,
mesmo que queiram
levar por
diante a gravidez
não lhes é
dada essa
oportunidade. E, caso
estejam numa situação
de “vida
miserável”,
ela certamente irá
perdurar depois de
terem abortado.
Estamos
assim diante
um problema
complexo, necessitando
por essa razão de
respostas que envolvam
várias entidades e
diferentes técnicos:
médicos, enfermeiros,
psicólogos,
assistentes sociais,
etc. Mas
por
que não
tentar fazer alguma coisa? Limitar o aborto a uma
questão de planeamento familiar
é uma visão
demasiado
redutora, atribuir-lhe apenas
razões sociais e
económicas é por
sua
vez demasiado
fatalista. Ao mesmo
tempo, aqueles
que abordam com
ligeireza a
interrupção voluntária
da gravidez como se
esta se resumisse a retirar um
piercing
em função da
vontade ou da
circunstância da
mulher, acabam por
ser, do meu ponto de
vista, demasiado
radicais, menosprezando as
vidas humanas
inocentes que se
perdem.
As
razões sociais,
psíquicas, económicas…; enfim,
de desgraça humana
relacionadas
com o aborto
não se resolvem
simplesmente através
do código
penal,
nem com
exercícios de retórica
política, ética,
religiosa, etc. Torna-se
por isso
necessário encontrar
soluções. É urgente
combater este
flagelo no terreno,
até porque a
resignação é o pior dos
males!