Alerta da Deco Cada vez mais portugueses com água e
electricidade cortadas por falta de pagamento
Portugueses que não conseguem pagar as facturas da
água, electricidade e gás tornou-se um cenário "cada
vez mais frequente", garante a associação de defesa
dos consumidores Deco, que atribui a situação à
crise económica.
Ao Gabinete de Apoio ao Sobre-Endividado da
Associação Portuguesa de Defesa do Consumidor (Deco)
chegam cada vez mais casos de consumidores que,
quando pedem ajuda, já estão sem água, gás ou
electricidade.
O corte do abastecimento dá-se por falta de
pagamento e, segundo Natália Nunes, da associação de
consumidores, revela uma outra "e mais grave" face
da crise.
"Nos anos anteriores, os consumidores chegavam com
dificuldades em cumprirem os pagamentos de outros
bens, mas nunca de serviços essenciais como água,
electricidade ou gás", contou.
Actualmente, são "cada vez mais frequentes" os casos
de sobre-endividados que, quando pedem ajuda, já
estão há algum tempo sem água, electricidade ou gás.
Segundo a EPAL, que abastece a água à população do
concelho de Lisboa, os avisos de corte emitidos em
2008 representaram quatro por cento do número das
facturas, embora só tenham sido executados 0,3 por
cento.
A empresa revelou à Agência Lusa que, em 2008,
emitiu 3.504.469 facturas, 140 mil cartas de aviso
(a dar mais um prazo para ser efectuado o pagamento,
antes do corte) e efectuou 10.660 cortes de
abastecimento.
Nos anos anteriores, foram realizados 9.174 (2007) e
8.069 (2006) cortes.
Em Setúbal, são aos milhares os cortes de
abastecimento de água por falta de pagamento. No ano
passado, deram-se 6.100 interrupções devido a
atrasos nas liquidações, segundo revelou à Lusa a
empresa Águas do Sado, concessionária dos Sistemas
de Abastecimento de Água e Saneamento deste
concelho.
A Águas do Sado contabiliza já dois milhões de euros
em dívida, valores com uma antiguidade superior a
seis meses.
No que diz respeito ao abastecimento de
electricidade, fonte da EDP disse à Lusa que a
empresa "não sente, por ora, sinais acentuados de
dificuldades de pagamento de electricidade" por
parte dos clientes, mas sem especificar o número de
cortes de abastecimento por falta de pagamento.
"Nas situações de incumprimento, a EDP, cumprindo a
lei, notifica o cliente para o facto de este estar
em incumprimento, alertando-o para a sanção inerente
(corte de fornecimento), e por fim, se a situação
persistir, avança para o corte de energia", referiu
apenas a empresa.
A Lusa sabe, contudo, que a empresa tem sido
contactada por clientes que tentam pagar as contas
de forma fraccionada, o que é, aliás, uma das
propostas da Deco para estes casos.
Segundo Natália Nunes, da Deco, viver sem água e
electricidade é um cenário "cada vez mais
frequente", que resulta, principalmente, de casos em
que o desemprego bateu à porta.
"São famílias que têm poucos e cada vez menos
rendimentos, até que deixam de poder pagar bens como
estes", disse, revelando que a Deco, nestes casos,
tenta ajudar de modo a que o consumidor consiga
pagar faseadamente as dívidas e possa, quanto antes,
voltar a ter água e electricidade.
Até o conseguirem, explicou, estas pessoas vivem
muitas vezes da ajuda de familiares e amigos, na
casa de quem tomam banho. Outros, sem gás ligado,
lavam-se com água fria.
Carlos Braga, dirigente do Movimento dos Utentes dos
Serviços Públicos (MUSP), também tem conhecimento de
"cada vez mais casos" de cidadãos que, por falta de
pagamento, têm de viver sem água nem electricidade.
"São situações que põem em causa a sobrevivência das
pessoas", disse Carlos Braga.
O dirigente do MUSP classifica de "insuficientes" as
medidas que têm sido adoptadas pelas autarquias e
responsabiliza-as por atribuir a empresas privadas a
domiciliação da água.
"Estas empresas [privadas] só pensam no lucro e não
levam em atenção as fragilidades dos cidadãos que,
pelos mais variados motivos, podem deixar de honrar
os seus compromissos", disse.