Correio da Manhã - 17 Mar 06
Elvas
Polémica na maternidade
Alexandre M. Silva, Évora
O médico obstetra José Melo e Sousa, presidente da Fundação Mariana
Martins, instituição gestora da Maternidade de Elvas, ameaça recorrer em
Tribunal contra a decisão do Governo de fechar aquela unidade materno-infantil.
De acordo com o que o CM apurou, a
queixa terá como fundamento o facto de a fundação
ter cedido na década de 80 um “terreno a custo zero”
para a construção do actual Hospital Santa Luzia,
com a obrigação de este manter a maternidade em
funcionamento, tal como refere o contrato assinado
em 8 de Novembro de 1984, entre Melo e Sousa e a
administração do antigo Hospital da Misericórdia de
Elvas.
Esta ameaça surge após o ministro da Saúde, Correia
de Campos, ter assinado um despacho, dia 14, que
determina o encerramento até Junho de 2006 dos
blocos de partos de Elvas, como também de Barcelos,
Santo Tirso e Oliveira de Azeméis.
Com esta decisão, as parturientes de Elvas que se
deslocarem a partir de Julho ao hospital local serão
transferidas para as maternidades de Portalegre,
Évora ou Badajoz (Espanha), esta última ao abrigo de
um protocolo a estabelecer entre a Administração
Regional de Saúde do Alentejo e os responsáveis da
unidade de saúde da Extremadura espanhola, Hospital
Infanta Cristina.
“Já escrevi ao ministro a lembrar que existe um
contrato entre o hospital e a fundação”, referiu
Melo e Sousa. “Quando receber a resposta oficial do
fecho maternidade apresento uma queixa em Tribunal
contra o Estado por incumprimento do acordo, que
permite a utilização por parte do Hospital de Santa
Luzia do material e do edifício desde que mantenha
em funcionamento a Maternidade Mariana Martins.”
Melo e Sousa, 94 anos e ‘pai’ da Maternidade de
Elvas, sublinhou ainda que, caso o Tribunal mantenha
a decisão do Governo, a fundação irá alterar o
contrato de arrendamento com o hospital. “A fundação
recebe uma de renda 200 euros, que aumentarão para
um mínimo de dez mil euros mensais. O dinheiro do
aumento da renda poderá permitir a continuidade da
maternidade.”
O CM tentou ontem, em vão, obter uma reacção do
Ministério da Saúde face à polémica.
ESPANHÓIS CONTRA
Os médicos da Extremadura espanhola não aprovam o
futuro acordo que permitirá, sobretudo às grávidas
da zona de Elvas, terem os seus filhos na unidade
materno-infantil do Hospital de Badajoz. Para os
clínicos, esta situação irá provocar uma ruptura nos
serviços da unidade.
Em comunicado, o Colégio dos Médicos de Badajoz
afirma que o acordo é “inviável e coloca em perigo o
sistema de saúde” extremenho, uma vez que os
hospitais da região estão sobrecarregados devido ao
aumento da imigração.
Na Maternidade de Elvas, de acordo com fonte
hospitalar, nascem em média 260 bebés por ano, menos
de um por dia.
CONTRA E A FAVOR
"DESEJO DE TER DOIS FILHOS" (Duarte Vilar,
Sociólogo)
“A questão da maior ou menor natalidade não tem a
ver com a presença de maternidades mais perto das
pessoas. Quer por uma questão de opção ou
possibilidade económica, a verdade é que a maioria
das pessoas em Portugal deseja apenas ter dois
filhos.”
"MENOS UM INCENTIVO" (Santos Cardoso, Mov. Utentes)
“O encerramento das maternidades vai ser um menos um
incentivo para quem quer ter filhos. E há outra
questão. Se um dos critérios para o fecho é o número
de partos inferior a 1500 por questão de segurança,
por que não se apresenta proposta idêntica para as
clínicas privadas com menos de 1500 partos?”
"POLÍTICA ANTINATALISTA" (Fernando Castro, Ass.
Famílias)
“Estranho muito que o Governo decida encerrar
maternidades em vez de criar incentivos para fixar
as populações. Desde há 30 anos que a política
governamental tem sido antinatalista e o fecho dos
blocos de parto é o resultado dessa mesma política.”
ALENTEJANOS CONTRA ENCERRAMENTO DA MATERNIDADE
MARIANA MARTINS, EM ELVAS
PATRIOTAS
A maioria das parturientes alentejanas preferem ter
os filhos no País. Florentina Aranha, 44 anos, mora
em Campo Maior e diz que se tiver de optar irá
“escolher uma maternidade portuguesa”.
CONDIÇÕES
Quatro obstetras, quatro pediatras, oito
enfermeiros, sete auxiliares e uma parteira são a
equipa da maternidade. Rosa Maria, parteira ali há
24 anos, garante que ficará a acompanhar as grávidas
nas ambulâncias.
FAMÍLIA
Ana Silva, 21 anos, residente em Elvas, teve o seu
primeiro filho na passada semana na Maternidade de
Elvas. “Tem um ambiente familiar e senti-me como em
casa. É uma pena fecharem esta maternidade.”
MINISTRO DA SAÚDE, CORREIA DE CAMPOS, NO
PARLAMENTO
"Desengane-se quem pensa que a requalificação das
urgências e apoio perinatal tem preocupação
económica."
"A reforma [cuidados continuados] elevará o número
de camas de saúde por mil habitantes de 2,2 para
3,6."
"Elevámos a qualidade [unidades de saúde familiar] e
cumprimos o objectivo de cobrir 1,5 milhões de
habitantes."
"O terceiro vector da nossa acção governativa
consiste na sustentabilidade financeira do SNS."
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