Diário de Notícias - 19 Mar 04
Pais aproveitam cada vez mais licença parental
PATRÍCIA VIEGAS
Os homens portugueses usufruem cada vez mais dos direitos de
paternidade consagrados na lei e assumem uma maior participação no
cuidado dos filhos. Esta é uma tendência que pode ser identificada
através da evolução dos dados do regime geral da Segurança Social
(os únicos que estão sistematizados), que mostram que o número de
beneficiários de subsídios por licença parental subiu de 146, em
2000, para 27 427, em 2003.
«O crescimento verificado nestes quatro anos é bastante expressivo.
Estes números reflectem aquilo que a investigação em Portugal tem
mostrado, e que é uma reivindicação crescente da paternidade por
parte dos homens. Esta é uma tendência que existe efectivamente e
que está, em parte, relacionada com as possibilidades que a lei
criou», confirmam, em declarações ao DN, Margarida Chagas Lopes e
Heloísa Perista, autoras do estudo A Licença de Paternidade - Um
Direito Novo para a Promoção da Igualdade, publicado em 1999.
Ao olhar para os dados do regime geral da segurança social (que
englobam os trabalhadores por conta de outrem e independentes com
esquema alargado de contribuição) verifica-se que a atribuição do
subsídio de paternidade (relativo às situações em que o pai goza
parte da licença de maternidade por decisão conjunta ou às situações
em que ocorre morte ou doença da mãe) aumentou até 2001 e desceu, a
partir de 2002, em favor dos subsídios por licença parental. A
alteração da lei, que em 2000 estabeleceu que os primeiros 15 dias
da licença parental do pai fossem subsidiados, «explica o aumento de
homens a gozar aquela licença».
Ainda no campo do subsídio da licença por paternidade, é possível
verificar que os beneficiários do subsídio de pai (relativo aos
cinco dias úteis gozados a seguir ao nascimento do filho), também
têm vindo progressivamente a aumentar desde 2000.
Mas, além da lei, a mudança de mentalidades e o desaparecimento de
alguns preconceitos relativos aos papéis da mulher e do homem na
sociedade, também têm contribuído para que os homens assumam mais
abertamente as suas responsabilidades de pais. Margarida Chagas
Lopes baseia-se nos resultados do estudo que fez em 1999 para
afirmar que «os pais, sobretudo os mais novos e escolarizados, já
não acham que a sua obrigação está cumprida quando trazem para casa
o dinheiro no fim do mês, tratam da parte dos impostos ou fazem
bricolagem ao fim-de-semana. Hoje em dia as gerações jovens vão mais
longe, dividem os sonos das crianças, os biberões, etc_ Os homens
devem libertar-se dos estereótipos que a sociedade lhes impôs e,
sempre que quiserem, devem poder acompanhar o crescimento dos seus
filhos, vê-los articular as primeiras palavras ou dar os primeiros
passos». E acrescenta: «antigamente a mulher colocava a vida
profissional em segundo plano e o homem fazia o mesmo com a vida
familiar. Mas agora as mulheres já trabalham, participam fortemente
no mercado de trabalho, e os homens devem participar também, cada
vez mais, na vida privada».
A necessidade de combinar de forma harmoniosa a vida pessoal e
familiar com a vida profissional e pública parece existir e, de
forma mais consolidada, entre as gerações mais jovens. Mas, apesar
de muitos homens quererem gozar os direitos de paternidade, há
ainda, nalgumas empresas, chefias ou mesmo colegas de trabalho que
os fazem recuar. «No nosso estudo haviam muitos homens que
respondiam que não exerciam a sua paternidade de forma mais efectiva
e continuada porque tinham receio de ficar mal vistos nos postos de
trabalho», conta Heloísa Perista, esclarecendo que «essas questões
têm ainda muito que ver com os códigos de masculinidade dominantes».
Margarida Chagas Lopes, por seu lado, explica «que nalgumas empresas
mais conservadoras ainda persiste uma mentalidade que é pouco
receptiva à visibilidade da esfera de reprodução social como uma
actividade tão contributiva como outra qualquer. Mas em Portugal
também há empresários mais abertos que já viram que o facto de o pai
e a mãe poderem descansar alternadamente, partilhando tarefas e
conciliando o trabalho e a família, é um factor de produtividade
importante».
Isto porque, tal como dizem as duas especialistas no seu estudo, «um
bom trabalhador nem sempre é aquele que se dedica exclusivamente ao
trabalho abdicando de todas as outras dimensões da sua vida».
Heloísa Perista e Margarida Chagas Lopes esperam que a medida
prevista no novo Código do Trabalho, que transforma os cinco dias de
licença de paternidade num direito indisponível, ou seja, o pai é
mesmo obrigado a gozar esse período de tempo, seja um «incentivo aos
pais», mas também uma garantia de que, da parte das entidades
empregadoras, «deixam de haver reticências na concessão desse
direito».
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