Diário de Notícias - 6 Mar 04

Que meios nos faltam?
Xavier Pintado   

Somos um povo com tendência para o pessimismo e melancolia. E encontramos muitas vezes justificação para esse pessimismo e inacção na ideia de que a «sorte» ou condições que se nos oferecem não são propícias. Somos um país pequeno e periférico, encostado a um país já grande, que não perde a ideia de «conquistar-nos»... Não possuímos riqueza ou recursos naturais - petróleo ou minérios com valia - e a própria agricultura é uma agricultura pobre.

Que poderemos fazer nestas condições? A resposta é mais simples do que se pensa: olhar o mundo face a face e tirar as conclusões que se impõem. E, curiosamente, estas não vão em sentido negativo como poderia crer-se. Um estudo recente de um notável da economia - Jeffrey Sachs, com Andrew Warner - sobre o grau de riqueza em recursos naturais e o crescimento das economias verifica que não são as economias com maior abundância de recursos naturais que tem conseguido as taxas mais elevadas de crescimento económico nas três últimas décadas, mas sim economias menos dotadas.

Bom número das primeiras tem mesmo estagnado ou registado um crescimento modesto, enquanto as segundas, em número significativo, tem-nas superado em larga medida na corrida para a prosperidade. Ao contrário do que se verificou com a Revolução Industrial no século XIX, em que as jazidas de carvão e aço se revelaram de grande valia, ultimamente a abundância de meios ou recursos naturais tem tido um impacto negativo sobre o crescimento económico, «deprimindo-o» em vez de o favorecer! Uma análise também recente do problema pelo Banco Mundial confirma estes resultados, mostrando que economias industriais como a alemã e a belga, e antes a japonesa, em poucos meses produzem um valor igual ou superior ao de todo o stock de recursos naturais que possuem. Ao mesmo tempo são geralmente países pequenos, como o Luxemburgo, a Suíça, a Noruega, a Irlanda e a Islândia, que não dispondo praticamente de recursos naturais de valia, ou os descobriram quando já tinham ultrapassado as primeiras fases de desenvolvimento, como no caso da Noruega, que se encontram no topo do quadro do rendimento per capita do mundo. E das grandes economias apenas uma - os EUA - as acompanha em nível de prosperidade e crescimento.

Entretanto, se olharmos para o mundo numa perspectiva do desenvolvimento nos últimos tempos verificamos que foram sobretudo pequenas economias do Leste asiático quase sem recursos naturais significativos, como a Coreia do Sul, a Formosa, Hong-Kong e Singapura, que obtiveram os melhores crescimentos, enquanto economias com abundância desses recursos, como as da Nigéria, México e Venezuela, estagnaram ou entraram em bancarrota!

Um dos exemplos mais impressivos deste paradoxo do desenvolvimento é o da Islândia. Um país com apenas 280 mil habitantes e um solo vulcânico onde as plantas mal despontam, e que dispõe de apenas um recurso natural com valia - a pesca - conseguiu resultados extraordinários em termos de prosperidade e crescimento. Quando há um século se independentizou da Dinamarca era o país mais pobre ou dos mais pobres da Europa, a sua taxa de inflação roçou os 100% e a sua dívida externa e défice orçamental atingiram valores recorde. Entretanto, em menos de duas décadas conseguiu situar-se entre os países com os mais elevados rendimentos per capita do mundo, praticamente eliminando o desemprego, reduzindo a taxa de inflação para 2-3% e obtendo um superávite nas contas públicas!

Como? Muito simplesmente e na expressão jocosa de Hannes Gissurarson, professor da Universidade de Reykiavik, «não tendo descoberto a América descobriu as políticas económicas correctas, de liberalização de mercados e abertura ao exterior, desnacionalizando empresas, acabando com subsídios às mesmas e introduzindo as reformas que se impunham para conseguir eficiência e dinamismo e persistindo nessa via com determinação». Que é, no fundo, aquilo que nos tem faltado.

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