Já não é só ouro que colocam no prego, mas também
relógios, obras de arte e até a roupa que trazem no
corpo. Penhoram para comprarem comida, dizem
comerciantes
A procura das casas de penhores em Lisboa e no Porto
cresceu em quase 50 por cento em relação a 2007.
Gerentes de lojas do sector nas duas cidades
explicam que se deve ao aumento do custo de vida.
«Trazem de tudo. Ouro, prata, peças grandes e
pequenas, chegam mesmo a trazer linhos e às vezes a
própria roupa que trazem no corpo querem vender. É
uma situação mesmo muito aflitiva», explicou à Lusa
António Antunes, responsável pelos penhores da
Joalharia Áurea, na Baixa de Lisboa, onde se
verificou um aumento de procura na ordem dos 30 a 40
por cento, em relação a Maio de 2007.
Estamos mais pobres. Acha que ainda existe classe
média?.
O recurso às casas de penhores - disse António
Antunes - é feito por pessoas de todos as camadas
sociais e acrescentou que as épocas de maior procura
são as do regresso às aulas (Setembro/Outubro), a
época de pagamento das contribuições autárquicas e
depois das festas (Natal e Ano Novo).
As casas de penhores emprestam dinheiro a clientes
que depositam determinado bem na loja. O penhorista
avalia o objecto, empresta determinada quantia e
indica que o artigo ficará na loja por um período de
três meses, durante os quais o artigo pode ser
recuperado. Depois desse tempo, a loja pode vender
legalmente o objecto.
«Apesar de haver o desejo de recuperar o artigo, são
cada vez menos as pessoas que o fazem», por
impossibilidade financeira, explicou António
Antunes.
João Fernandes, da ourivesaria Isauria Lda., também
na baixa de Lisboa, descreve um cenário ainda pior:
a procura dos seus serviços tem sido mais baixa este
ano porque, considera, «as pessoas já nada têm para
penhorar».
Para comer sopa e pagar salários
No Porto a situação verificada pela Lusa é
semelhante. «Nos últimos tempos a procura desta casa
aumentou em cerca de 50 por cento. E esta actividade
funciona como um pêndulo da sociedade. Só demonstra
como a sociedade está carecida e pobre», disse
Aníbal Aníbal Ferreira, gerente de uma loja da União
de Crédito Popular SA, no Porto.
Segundo Aníbal Ferreira as pessoas recorrem à loja
de penhores tanto para conseguirem comer uma sopa
como para pagarem os salários dos seus funcionários.
Para este gerente, o facto de os bancos dificultarem
os empréstimos leva a que as pessoas se dirijam à
loja de penhores onde tudo «é mais simples e mais
rápido».
Também Carlos Oliveira, funcionário da loja de
penhores Prestus, evidencia o aumento "de mais de 40
por cento" do fluxo de pessoas na loja de penhores,
revelando que «as pessoas estão cada vez mais
endividadas e as prestações cada vez mais
atrasadas».
«Já não é só o ouro ou a prata que as pessoas
trazem. Cada vez mais pessoas aparecem a quererem
penhorar relógios e até mesmo obras de arte de
autores conhecidos», disse o funcionário. «Os
motivos da procura são quase sempre os mesmos:
pagamentos de salários em atraso e a compra da
própria alimentação», acrescentou.
«Apesar de haver mais pessoas a recorrerem, a crise
também nos afecta, porque as pessoas têm cada vez
menos poder de compra e por isso não têm ouro, ou
até mesmo prata, para penhorarem», disse.