Educação Sexual
Programas sem controlo
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Um
teatro sugerido para o 2.º e 3.º ciclos: 5
alunos «fazem» uma viagem de avião e chegam a
uma terra onde a maioria da população é
homossexual. Improvisam-se diálogos entre
viajantes e população e o debate deve ser
orientado para questões como: um comportamento é
saudável ou normal porque é maioritário? Outro
exercício, para o 1.º ciclo, é falar sobre os
diversos tipos de família a partir deste desenho |
EM EXERCÍCIO de 50 minutos, destinado a turmas do 5.º e
do 6.º ano, propõe que, durante a aula, os professores
ponham os alunos de 10 a 12 anos a pensarem no maior
número possível de sinónimos para palavras como
testículos, pénis, vagina ou relação sexual. De acordo
com os manuais para os professores é
«normal e aceitável utilizar expressões consideradas
menos adequadas» e que podem mesmo
«causar embaraço ou
tornar-se desagradáveis». No final, e
esgotadas todas as hipóteses, os estudantes devem afixar
num «placard» o resultado deste trabalho.
Este é um dos exemplos das tarefas propostas para o
ensino de Educação Sexual, uma matéria transversal, isto
é, que pode ser dada por qualquer professor e em
qualquer disciplina entre o 1.º e os 12.º anos de
escolaridade. Em Outubro de 2000, os Ministérios da
Educação e da Saúde produziram umas
«linhas orientadoras da
Educação Sexual em Meio Escolar» que passaram
a estar em vigor. Foram feitos manuais e sugeridos
textos para ajudar os professores, mas nunca foi feita
qualquer avaliação. Neste momento, ninguém sabe como foi
dada, por quem e a quantos alunos chegou esta
informação. Muito menos se apurou a eficácia deste tipo
de conteúdos.
«Ridículo».
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Esta
ficha, integrada num livro espanhol sugerido
pelo Ministério da Educação, pretende introduzir
nas salas de aula do 1.º ciclo a questão da
masturbação. O professor deve perguntar: o que
está o rapaz a tocar (o mesmo para a rapariga)?
Já fizeste isso? Onde o fazes? Com quem o fazes? |
Para Manuela Calheiros, psicóloga e professora
universitária, «o
exercício proposto é ridículo». Mas esse não
é o maior problema deste projecto educativo. Com efeito,
por não ser «testado,
por não ser feita formação de professores e avaliados os
resultados», há aqui
«uma falha gravíssima»,
tanto mais que ninguém sabe
«quem é responsável»
pelas eventuais falhas cometidas. Manuela
Calheiros vai mais longe:
«não há contexto
emocional» em todos os conteúdos
programáticos sobre sexualidade, tal como ausentes estão
«as famílias, o
próprio envolvimento cultural e, mais grave, a
possibilidade de qualquer pessoa dizer ‘não’».
Para a psicóloga, mais importante do que enumerar e
enunciar os actos sexuais - sejam eles quais forem -
«é formar os alunos para
sentimentos positivos e negativos» e, nesse
processo, «aprender a
conhecer-se e reconhecer que pode recusar situações ou
atitudes que não aceite».
Outra proposta de trabalho apresentada nos manuais de
apoio aos professores, tendo como destinatários crianças
de 10 e 11 anos, consiste em pôr os alunos a colorir uma
figura (masculina ou feminina), para depois assinalarem
«as partes do corpo
que elas gostam, ou não, que sejam tocadas. Estes
desenhos podem ser recolhidos de forma a constituírem
informação para o professor». Outra sugestão
passa por pedir aos alunos que façam
«uma lista com todas as
manifestações sexuais que venham à ideia, colocando à
frente de cada um o tipo de sensações presentes».
Como exemplos sugeridos aos professores são elencados:
«manipulação dos
órgãos genitais, beijos entre namorados, relação sexual».
Pais fora de jogo?
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Este
desenho - destinado ao 1.º ciclo - visa pôr os
alunos a falar das diferenças entre
rapaz/rapariga, homem/mulher, rapaz/homem e
rapariga/mulher. «Recorta as figuras e coloca-as
na casa de banho», sugere este manual espanhol,
recomendado pelo Ministério da Educação |
O conteúdo desta «disciplina» está longe de ser
consensual. Uma professora do 3.º ciclo recusou-se mesmo
a seguir os manuais propostos, mas foi advertida pela
direcção da escola
«de que não podia fazer objecção de consciência»
e corre o risco de ser punida disciplinarmente se não
acatar a ordem.
Claudia Muller, mãe de várias crianças, decidiu ir
assistir a uma sessão de esclarecimento para alunos,
promovida pela Associação de Planeamento da Família na
escola dos seus filhos. Destinada a crianças entre os 9
e os 12 anos, a apresentação esclarecia questões tão
diversas como «para
onde vai o esperma» ou
«o que é o sexo oral»,
finalizando com a médica de um centro de saúde da região
de Mafra a dar os seus contactos telefónicos às crianças
que quisessem esclarecer outras dúvidas.
«É um desprezo total
pelos pais, que a toda a hora são chamados à escola.
Menos sobre a educação sexual dada aos seus filhos»,
conclui esta mãe, que se confessa
«chocada pela total
exclusão dos encarregados de educação».
Por seu lado, Albino Almeida, presidente da Confederação
das Associações de Pais (Confap), é pessoalmente adepto
da educação sexual nas escolas. Mas admite que a actual
orientação tem
«lacunas e alguns temas estão desadaptados»
às faixas etárias a que se destinam. Os vários tipos de
família apresentados, por exemplo,
«deviam surgir como
vários tipos de união».
«Pares homossexuais não se enquadram no meu conceito de
família»,
sublinha Albino Almeida.
«Nem está enquadrada na
lei», acrescenta Manuela Calheiros.
Paula Vilariça, pedopsiquiatra do Hospital Dona
Estefânia, considera mesmo a desadequação etária um dos
problemas mais graves deste programa. Além disso, os
conteúdos apresentados
«não são esclarecedores»
e podem mesmo
«ser perturbadores,
agressivos e até traumáticos para alguns alunos».
Defendendo uma estratégia mais informativa para estas
aulas, a médica rejeita este projecto nos termos em que
está apresentado, por o considerar
«um atentado à fantasia
e à inocência».
Albino Almeida sustenta esta ideia ao referir que a
maior lacuna do projecto
«é a não inclusão das
doenças sexualmente transmissíveis». Em vez
de informar, «o
programa diverte-se com conteúdos desfasados, esquecendo
as doenças que são parte fulcral em matéria de
sexualidade», conclui.
A APF - que subscreve as linhas orientadoras e assinou
um protocolo com o Ministério da Educação para promover
a Educação Sexual nas escolas - garante, no seu
relatório anual, que
«muitas escolas estão já envolvidas» e
«em todo o território
nacional».
«Mas estamos longe de
poder afirmar que todas ou a maior parte das crianças e
jovens têm acesso a actividades de educação sexual»,
dizem, reclamando a publicação de legislação que
obrigue, efectivamente, as escolas a cumprir este
programa.
Monica Contreras e Rosa Pedroso Lima com Susana Branco
Programa educacional
JOÃO Araújo, professor universitário e pai de
quatro crianças, dedicou muitas horas a estudar
o programa oficial de Educação Sexual. Os
aspectos que mais o chocaram foram organizados
num CD que passou a mostrar pelo país, em
sessões de esclarecimento para as quais é
convidado.
O EXPRESSO foi assistir. Pais, e por vezes
professores, enchem as salas para verem uma
selecção de textos, desenhos e jogos sugeridos
para as salas de aulas. A partir destes dados -
confirmados pelo EXPRESSO nos textos originais
que servem de documentação oficial - foram
pedidas opiniões a diversos especialistas.
A grande responsável pela actual filosofia
orientadora da educação sexual nas escolas é a
Associação para o Planeamento da Família (APF) -
filial de uma das maiores ONG mundiais - que
participou na produção das «Linhas
Orientadoras», fez vários manuais, formou e
continua a formar professores no âmbito de
protocolos com o Ministério da Educação.
Um dos livros aconselhados - «Educação Sexual na
Escola», de Júlio Machado Vaz e Duarte Vilar, da
APF - propõe como conteúdos para o pré-escolar e
o 1.º ciclo: aprender a realizar a masturbação,
se existir, na privacidade; conhecer diferentes
tipos de família; adquirir um papel de género
flexível e reconhecer comportamentos sexuais
como carícias, beijos e relações coitais. |
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