Diário de Notícias - 10 Mai 03
Um ensino superior de qualidade?
Fernando Branco
No processo de «Avaliação, Revisão e Consolidação da Legislação do Ensino
Superior», o senhor ministro da Ciência e Ensino Superior colocou a discussão
pública um documento intitulado «Um Ensino Superior de Qualidade». Ao lançar
este processo o senhor ministro revela coragem e propõe-se corrigir alguns dos
problemas do ensino superior. Merece por isso que o ajudemos. É o que faço neste
artigo chamando a atenção para alguns aspectos relativos ao financiamento que
merecem correcção.
No documento especifica-se que «o fim último do financiamento é a melhoria da
qualidade do ensino superior» (pág. 20), para logo em seguida se escrever que «o
Estado reafirma o seu compromisso em aumentar o investimento por estudante no
ensino superior, assim como assegura a todos os estudantes que pretendam
frequentar o ensino que não deixarão de o fazer por insuficiências financeiras.»
Ora, há pelo menos dois aspectos em que as grandes medidas detalhadas no
documento não são a melhor forma de promover estes objectivos.
Em primeiro lugar, se se quer promover a melhoria da qualidade do ensino
superior, os mecanismos de financiamento devem-se aplicar a todas as
instituições de ensino superior, independentemente de serem estatais ou não
estatais. De outro modo, continuar-se-á a penalizar a qualidade fora do ensino
superior estatal. Um exemplo simples e claro que todos os leitores perceberão (e
que o senhor ministro conhece).
As licenciaturas em Economia e Gestão da minha Faculdade têm sistematicamente
sido reconhecidas como das melhores do país. Em 2002 isso foi bem claro ao
obtermos os primeiros lugares em rankings elaborados pela imprensa especializada
e ao recebermos as mais altas classificações da comissão que nos avaliou no
âmbito da processo de avaliação promovido pelo Conselho de Reitores. Porém,
mesmo sabendo que todos os alunos que optaram por estudar connosco foram
igualmente admitidos num curso do ensino estatal (ou teriam sido se se tivessem
candidatado), o Estado não financia qualquer fracção das despesas correntes da
minha Faculdade. O nosso financiamento tem de ser assegurado pelas propinas que
cobramos aos alunos. Naturalmente alguns deixam de aceder a este ensino de
qualidade por insuficiências financeiras. Não se esqueça, pois, senhor ministro
de corrigir este lapso.
Mas há um segundo óbvio problema. A propósito de alunos estrangeiros está
escrito que «o preço da propina para alunos estrangeiros é fixado livremente
pelas instituições, tendo como valor mínimo o máximo de propina para nacionais»
(pág. 22) mas nada se diz sobre se esses alunos serão ou não considerados para
efeito do financiamento do Estado às instituições. Não deixarão por isso de
surgir alguns que pensem que o senhor ministro está a prever afectar o dinheiro
público ao financiamento dos estudos de alunos estrangeiros que frequentem
instituições estatais quando nega o financiamento dos estudos dos alunos
nacionais de qualidade que optem por frequentar cursos de instituições não
estatais. Não se esqueça, pois, senhor ministro de corrigir este lapso.

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