Diário de Notícias - 24 Jun 08

 

Editorial

Porque Portugal já não precisa de auto-estradas

 

O Portugal de hoje não é o Portugal que os governos de Cavaco Silva rasgaram de auto-estradas nos anos 80. Esse era um país onde a demora e o mau estado das estradas prejudicavam o desenvolvimento. Nessa altura, as auto-estradas podiam ser consideradas infra-estruturas básicas. Hoje, as auto--estradas que continuamos a fazer e a projectar já podem ser consideradas um luxo. Basta dizer que para ir de Lisboa ao Porto podemos escolher entre dois percursos.

 

Segundo dados divulgados esta semana pelo Eurostat, as famílias portuguesas são das que mais dependem dos combustíveis, são as segundas que mais gastam com gasóleo e gasolina para uso pessoal - apenas precedidas pelas famílias italianas. E são também aquelas em que estes gastos mais cresceram, ao contrário do resto da Europa, onde a diminuição foi acentuada.

 

É, de facto, necessário inverter esta tendência. E não é fazendo auto-estradas que o conseguiremos. Talvez fosse possível mudar o paradigma, investir, por exemplo, numa grande e eficiente rede de caminhos-de-ferro.

 

Quando Manuela Ferreira Leite falou em desinvestir em obras públicas, podia ter usado qualquer um destes argumentos. Seriam mais "de futuro" do que a ambivalente questão da ajuda aos pobres ou novos pobres. Esta dá ao outro lado, de bandeja, os argumentos do emprego do investimento acelerador da economia. E, para ajudar, melhor do que pescar...

 

Não é normal alunos, professores e especialistas estarem de acordo. Muito menos quando o assunto se chama Matemática. Mas, à semelhança do que já tinha acontecido antes em outras áreas, no final do exame nacional de Matemática do 12.º ano, a que ontem se submeteram cerca de 50 mil estudantes, as opiniões eram unânimes: "fácil", "acessível", "sem problemas de maior", foi como o caracterizaram.

 

Como se sabe, o nível de iliteracia a Matemática no nosso país é considerado um problema grave do nosso ensino (o outro é o Português). Em 2006, no estudo para o Programa Internacional para a Avaliação de Alunos (PISA), que a OCDE publica de três em três anos, a média de conhecimentos a Matemática dos alunos portugueses era de 466 (a média global é de 500), e Portugal ocupava o 37.º lugar do ranking, só deixando atrás de si a Itália, a Grécia, a Turquia e o México. Pior: o valor era o mesmo de três anos antes, o que provava não ter existido evolução.

 

É verdade que a média nacional, apesar de continuar negativa, tem melhorado entretanto. Passou de 6,9 em 2005, para 7,3 em 2006 e para 9,6 no ano passado. Uma subida gradual, que seguramente se irá reflectir para o ano no próximo estudo da OCDE. Mas perante a coincidência da melhoria das notas e da facilidade que alunos, professores e especialistas encontram nos exames, fica uma dúvida inaceitável: queremos melhores estudantes ou um melhor ranking?