Enquanto rebentam escândalos nas universidades, uma
nova geração prepara-se para entrar no ensino
superior. Vale a pena, sem pretensões, dar uma
simples olhadela a essa realidade. Há coisas que só
vistas!
No ano lectivo de 1950/51 havia em Portugal quatro
universidades (Lisboa, Técnica, Coimbra e Porto) num
total de 21 estabelecimentos de ensino superior
(faculdades, institutos, escolas). Em 1975/76 havia
mais quatro (Aveiro, Minho, Católica e Nova) em 73
estabelecimentos. No ano lectivo de 2005/06 tínhamos
24 instituições intituladas "universidade" e 326
estabelecimentos.
Na leccionação o crescimento foi ainda maior. Em
1950/51 existiam 49 nomes diferentes de cursos,
representando um total de 90 possibilidades de
matrícula nas várias escolas. Em 1975/76 as
designações eram já 121, dando 246 opções de
inscrição. Em 2005/06, havia uns incríveis 1877
títulos diferentes, permitindo aos pobres candidatos
escolher entre 5485 alternativas de escola/curso.
Destas, 102 eram bacharelatos, três mil
licenciaturas (das quais 1307 com possibilidade de
bacharelato), 776 mestrados, 1161 cursos de
doutoramento e 446 outros graus (especializações,
formações complementares, etc). A pirâmide está
invertida.
Olhando só as licenciaturas, existem hoje 854 nomes
diferentes. Um caso interessante é a Engenharia. Em
1950/51 havia nove tipos (Civil, Electrotécnica,
Mecânica, Químico-Industrial, Minas, Agrónoma,
Silvicultora, Geográfica e Militar), com 17
possibilidades de inscrição. Em 1975/76 eram 12. Uma
mudara de nome (para Química), duas perderam o
título de Engenharia (Agronomia e Silvicultura) e
cinco novas surgiram (Máquinas, Metalúrgica, Têxtil,
Informática e Maquinista Naval) num total de 26
inscrições. Mas em 2005/06 existiam 137 tipos
diferentes de Engenharias em 586 diplomas.
Entre muitas outras, temos Engenharia Agrária,
Agrícola, Agro-Florestal, Agronómica, Agro-Pecuária,
Agrotecnológica, Florestal, Ambiental e dos Recursos
Naturais, Biofísica, das Ciências Vitivinícolas e
Zootécnica. Há Engenharia Cerâmica, das Madeiras, de
Polímeros, Papel, Vestuário, Vidro. E ainda
Engenharia Eléctrica, Electrónica, Electromecânica,
Electrotécnica e até Mecatrónica. Temos Engenharia
Publicitária, Alimentar, Automóvel, Aerospacial,
Topográfica, Engenharia da Qualidade, Engenharia
Clínica e Engenharia da Linguagem e do Conhecimento.
Outro campo peculiar é o da Gestão. Em 1950/51 havia
só quatro licenciaturas em Administração (Comercial,
Militar, Naval e Colonial), mas em 1975/76 já eram
oito e começara a confusão das nomenclaturas. Em
2005/06, os 115 nomes da área pretendem fazer a
gestão, direcção, administração, organização ou o
planeamento de qualquer coisa. E são muitas coisas!
Há Gestão Hoteleira, mas também Gestão da Água, do
Solo e da Rega ou Gestão de Transportes,
Intermodalidade e Logística. Há Gestão do Desporto,
Gestão do Lazer e Animação Turística, Gestão do
Património, Gestão de Rotas Temáticas e Direcção de
Orquestra. E, claro, temos Gestão Bancária, de
Recursos Humanos, de Informação, Marketing,
Financeira e Fiscal. Mas também existe Planeamento
Regional e Urbano, Tecnologias da Informação
Empresarial, Química Industrial e Gestão. E até
licenciaturas em Estudos Ingleses e Relações
Empresariais, Filosofia e Desenvolvimento da
Empresa, Tradução e Assessoria de Direcção, Línguas
e Administração Editorial.
Estas são áreas que dizem dar emprego. Também há
outras. Num país com cada vez menos alunos, existem
618 opções (11% do total) com "educação", "ensino",
"escolar" ou "professor" no título. Há também
doutoramento em Linguagens, Identidade e
Mundialização, mestrado em Sexologia, licenciatura
em Enologia e bacharelatos em Equinicultura ou
Informação Médica e Farmacêutica. Há licenciaturas
em Arquitectura de Design de Moda, mestrados em
Evolução Humana, Aconselhamento Dinâmico, Medicina
de Catástrofe, Psicologia da Dor ou Ciências do Sono
e doutoramento em Estudos sobre as Mulheres.
O povo diz que "um burro carregado de livros é um
doutor". Um povo carregado de cursos é um desastre.