Todas as épocas, suponho, geram os seus grupos
políticos dominantes, aqueles que impõem uma
linguagem e um modo de ver a realidade. Os jornais
popularizam esse domínio, a opinião pública
interioriza e num ápice, sem darmos por isso,
estamos todos a falar usando os mesmos padrões.
Nos anos 70, a política portuguesa era controlada
por ardentes "revolucionários" que usavam a cassete
típica e até meteram a "revolução permanente" na
Constituição. Quando o cavaquismo iniciou a
normalização do País, Portugal encheu-se de
"optimistas" em deslumbramento com o progresso. O
guterrismo apareceu depois para ser o período áureo
dos "pedagogos": gente para quem os dramas nacionais
eram psicoses que se resolveriam com conversa.
Neste Portugal em crise do ano da graça de 2008,
podemos dizer que o grupo dominante na política
pátria é o do "o País precisa". Abrimos um jornal ou
uma televisão, almoçamos aqui e ali, falamos com um
famoso ou um anónimo e todos sem excepção abrem as
frases com "o País precisa". Portugal pode estar num
beco complicado, mas não tem falta de gente que sabe
o que "o País precisa". Na lógica do grupo "o País
precisa", fazer política consiste em anunciar tudo o
que "o País precisa" como se fossem evidências. O
grupo anda espalhado pela esquerda e pela direita. O
que o distingue não é tanto uma política definida,
mas um método. Nunca deixa de dizer "o País
precisa".
É o eng. Sócrates que disse anteontem "o País
precisa de voltar à escola". É o empresário que
adverte "o País precisa de produzir mais". É o
esquerdista exclamativo que avisa "o País precisa de
acabar com a desigualdade". É o direitista não menos
exclamativo que esclarece "o País precisa de mudar
de mentalidades". É o inconsequente que apela "o
País precisa de todos". Sempre "o País precisa".
Ora sem dúvida que "o País precisa". E precisa
precisamente disso tudo: educação, responsabilidade,
produtividade e por aí fora. Em princípio ninguém
discorda. O grande problema do grupo "o País
precisa" é que define prioridades e nalguns casos os
meios para as concretizar, mas não diz nem pensa
como é que portugueses de vários contextos,
profissões, vivências, classes sociais, ritmos de
aprendizagem e adaptação, podem adquirir as "normas"
de uma cultura social mais exigente e disciplinadora.
As reformas não nascem por silogismo. Queremos
estudantes mais aplicados, trabalhadores mais
produtivos, cidadãos mais responsáveis, mas a
verdadeira questão é que tipo de programas,
estímulos e instituições podem orientar e motivar
pessoas muito diferentes a aprender melhor, a
produzir mais e a responsabilizar-se pelas suas
vidas? Num tempo que privilegia o concreto face ao
abstracto, políticos que demonstrem esta
sensibilidade partem em vantagem.