Mais de metade do ano já se evaporou. O Governo
inscreveu, no relatório do Orçamento do Estado para
2008, uma previsão de receitas com privatizações
próximas de mil milhões de euros mas, até agora, não
realizou sequer um cêntimo. Ainda assim, o discurso
oficial garante que a meta será alcançada. Pode ser
que sim, mas a situação dos mercados não vai ajudar.
Nesta matéria de alienação de participações detidas
pelo Estado, a conjuntura já esteve mais atraente. A
crise financeira já tinha estourado e quebrado a
confiança no investimento em acções quando a EDP
Renováveis decidiu abrir o capital e pedir a
admissão à cotação. Mas o sucesso nesta colocação
não teve correspondência na valorização dos títulos
a curto prazo. Num país pouco disponível para visões
mais alargadas, o desempenho titubeante da
Renováveis desde que se estreou em bolsa é um grão
de areia na engrenagem das operações que o Governo
ainda queira concretizar este ano.
De um eventual incumprimento dos objectivos quanto a
proveitos alcançados através de privatizações não
resultará directamente qualquer problema adicional
para o controlo do défice. Fernando Teixeira dos
Santos já sabe quais são os alçapões que estão
abertos à sua frente. O abrandamento da economia
será mais forte do que alguma vez o Governo previu e
a desaceleração da cobrança fiscal já provocou
reacções no quartel-general do Fisco. As ordens são
para avançar sobre os contribuintes que estão em
falta. Depressa e em força.
Sobre os efeitos indirectos, a conversa é outra. Os
900 milhões de euros projectados pelas Finanças como
receitas de operações de privatização seriam uma
bem-vinda aspirina para ajudar a atenuar as
consequências da subida do preço do dinheiro na
rubrica dos encargos com a dívida pública.
Tal como as famílias, também os cofres públicos
estão a sofrer a pressão do aumento das taxas de
juro. Caso se recorde que a baixa dos juros e o
crescimento das receitas fiscais foram os dois
principais parceiros da inconsistente consolidação
orçamental que lançou o país numa ilusão de
prosperidade, falhar o encaixe com a venda de acções
da carteira do Estado é mais um sopro ameaçador
sobre o castelo de cartas das finanças públicas.
A leitura do relatório que faz o ponto de situação
sobre o sector empresarial do Estado permite mais
algumas conclusões sobre a pressão da dívida que se
encontra no perímetro público. Metade das
necessidades de financiamento referem-se ao recurso
ao crédito, o que significa perspectivas de pioras
na saúde financeira do sector, provocadas pelo
actual ciclo de aumento das taxas de juro.
Há indicadores globais que revelam melhorias, mas
áreas de actividade como os transportes continuam a
ser um sorvedouro de recursos, acumulando défices
para os quais não houve mago que encontrasse uma
solução. E, apesar das privatizações, o Estado não
pára de aumentar o seu peso na economia. Até quando?