A década está perdida. Os primeiros dez anos do
século XXI traíram as nossas expectativas de
prosperidade fácil e rápida. Hoje, no centro de uma
crise internacional gravíssima, somos confrontados
com um futuro que nos impõe menos idas às catedrais
de consumo que proliferam pelo país e mais visitas
ao mealheiro para ir pagando as dívidas.
Chegou a conta dos excessos cometidos desde a
segunda metade dos anos 90.
A história dos nossos comportamentos económicos e
financeiros nos últimos dez anos é semelhante à de
uma família a quem disseram que tinha ganho o
Euromilhões. Ainda sem o dinheiro, liberou a sua
fúria gastadora. Os bancos acreditaram e
emprestaram-lhe os milhões... e com eles se
compraram casas, carros, férias que, diziam, eram só
para os ricos. De repente descobriu que, afinal, não
tinha ganho os milhões. Mas tem de pagar a dívida.
Como? Vendendo o que tem e, se não tem, emigrando.
Poderiam os governos ter evitado este caminhar para
o abismo que os economistas viram desde a primeira
hora? Há a tese de que não, não poderiam ter feito
nada. Como agora nada podem fazer para evitar a dor
da crise.
É sempre mais fácil construir um caminho alternativo
quando a história já passou. Mesmo sabendo isso,
vale a pena pensar no que poderia ter sido feito e
não foi. Desde que se tornou clara a integração de
Portugal no euro, instalou-se uma euforia que
atravessou toda a sociedade. Estado, empresas e
famílias viram nessa moeda única a entrada no clube
dos riscos. Todos se esqueceram que o país estava
longe de ser rico.
Esse foi também o tempo da
instabilidade política, governos sem maioria, como
os de António Guterres, e de coligação, como o de
Durão Barroso e Paulo Portas. E exactamente quando o
país precisava também de maior restrição financeira
vivia-se em tempos de grande generosidade
internacional na concessão de créditos, que hoje se
verifica excessiva.
O que se pode fazer agora para evitar esta crise?
Por incrível que pareça, o melhor que se pode fazer
é não fazer nada. Não porque não se pode fazer nada
- é sempre possível actuar - mas porque nada fazer é
neste momento a melhor política. Como afirmou o
governador do Banco de Portugal, apenas se deve
redistribuir.
Além de endividado, o país está mais pobre. E o que
se pode fazer é apenas distribuir o bolo, mais
pequeno, de outra forma. Taxas Robin Hood ou, à
portuguesa, Zé do Telhado são soluções para o Estado
arrecadar mais receitas para apoiar as pessoas mais
afectadas pela crise. Esta é uma boa oportunidade
para tributar rendimentos mais elevados tendo o
cuidado de não agravar ainda mais a situação.
A preocupação que o PSD tem manifestado com os
investimentos públicos integra-se nesta linha de
evitar um maior agravamento do défice externo. O
desequilíbrio nas contas externas aproxima-se de
valores recorde, só comparável com o tempo em que
Portugal teve de pedir ajuda ao Fundo Monetário
Internacional. Com o euro não virá o FMI. Mas
corremos crescentemente o risco de só conseguir
crédito com taxas de juro cada vez mais elevadas,
aumentando os encargos e obviamente agravando ainda
mais o défice externo.
Estamos com uma trajectória explosiva que só pode
ser evitada com menos consumo e mais poupança. De
todos, famílias, Estado e empresas.