Porque é que os trabalhadores do Metro de Lisboa acham que os
contribuintes têm o dever de pagar todos os seus 36 dias e meio de
férias por ano?
1. O Banco de Portugal está mais optimista. As novas previsões para
a economia portuguesa, ontem apresentadas, mostram que o produto
está a acelerar continuamente e deverá crescer 2,1 por cento no
próximo ano. Este é um valor que já não se verifica desde 2001. Mas
é pouco, muito pouco. Só a desgraça que tem sido a evolução da
economia do país nos últimos anos, as baixíssimas expectativas e a
falta de ambição colectiva que se instalou transformam em optimismo
aquilo que, noutros países, seria um sinal de muita preocupação.
Vá lá que o crescimento é baixinho, mas pelo menos tem um bom
perfil. Depois das exportações, donde caíram as migalhas de
crescimento dos dois últimos anos, vai ser o investimento a dar um
contributo até ao final de 2008. Não o investimento público, que vai
continuar a cair - défice orçamental oblige -, mas o investimento
das empresas, que deverá subir 4,8 por cento no próximo ano. Este é
um indicador-chave para perceber se a economia vai conseguir criar
empregos ou não.
O consumo das famílias vai continuar anémico, mas isso faz parte da
cura de um país sobreendividado perante a banca e perante o
exterior.
Os maiores riscos de isto falhar estão, claro, no Estado. Como o
Banco de Portugal refere por várias vezes nas 25 páginas do
documento, ou há reforma da administração pública este ano, ou estas
projecções podem ficar ameaçadas. Por isso, mais do que fazer
discursos onde o desejo fala mais alto do que a realidade, o Governo
tem que fazer a sua parte do trabalho de casa e dar o seu contributo
para um crescimento que possa ser duradouro no futuro. Se o fizer
bem, já não faz pouco.
2. O terrorismo laboral não é um exclusivo de certos patrões. Alguns
trabalhadores e sindicatos também conseguem atingir níveis
indecorosos na defesa daquilo que julgam ser os chamados "direitos
adquiridos". O que se está a passar nos últimos meses no Metro de
Lisboa é um bom exemplo disso. Sucedem-se as greves, cirurgicamente
marcadas para períodos de hora de ponta com o objectivo de
transtornarem mais e serem notadas por maior número de pessoas. O
que é pena é que a generalidade dos utentes não perceba o que está
em causa nesta reivindicação dos trabalhadores do Metro. Protestam
porque estão contra a revisão do acordo de empresa actualmente em
vigor e querem prolongá-lo até 2011. E o que querem os trabalhadores
da empresa manter? Um regime de férias que chega aos 36 dias e meio
úteis por ano (recusam reduzir para 28 dias e meio, contra os 22 que
a generalidade dos trabalhadores têm); períodos de trabalho diários
de seis horas, divididos em dois períodos de três horas em que um
deles é passado sem conduzir; prémios de produtividade automáticos
(isto é, desligados da produtividade...) de 12 cêntimos por
quilómetro percorrido e pago mesmo em relação ao 13º e 14º meses; e
outras regalias e subsídios que transformam a gestão de qualquer
empresa numa aventura que só pode acabar mal.
Mas o Metro é uma empresa do Estado e, por isso, não vai à falência.
O prejuízo anual de 160 milhões de euros é pago, claro está, pelos
contribuintes. Muitos destes têm sido deixado apeados várias manhãs
por um pequeno grupo de trabalhadores que acha que eles têm a
obrigação de pagar todos os seus 36 dias úteis de férias por ano.
Trinta e seis dias e meio, para ser mais rigoroso. Se isto não é um
ultraje, então o que será? Paulo Ferreira