Público - 10 Jan 07

 

Economia e Metro de Lisboa

 

Porque é que os trabalhadores do Metro de Lisboa acham que os contribuintes têm o dever de pagar todos os seus 36 dias e meio de férias por ano?

1. O Banco de Portugal está mais optimista. As novas previsões para a economia portuguesa, ontem apresentadas, mostram que o produto está a acelerar continuamente e deverá crescer 2,1 por cento no próximo ano. Este é um valor que já não se verifica desde 2001. Mas é pouco, muito pouco. Só a desgraça que tem sido a evolução da economia do país nos últimos anos, as baixíssimas expectativas e a falta de ambição colectiva que se instalou transformam em optimismo aquilo que, noutros países, seria um sinal de muita preocupação.
Vá lá que o crescimento é baixinho, mas pelo menos tem um bom perfil. Depois das exportações, donde caíram as migalhas de crescimento dos dois últimos anos, vai ser o investimento a dar um contributo até ao final de 2008. Não o investimento público, que vai continuar a cair - défice orçamental oblige -, mas o investimento das empresas, que deverá subir 4,8 por cento no próximo ano. Este é um indicador-chave para perceber se a economia vai conseguir criar empregos ou não.
O consumo das famílias vai continuar anémico, mas isso faz parte da cura de um país sobreendividado perante a banca e perante o exterior.
Os maiores riscos de isto falhar estão, claro, no Estado. Como o Banco de Portugal refere por várias vezes nas 25 páginas do documento, ou há reforma da administração pública este ano, ou estas projecções podem ficar ameaçadas. Por isso, mais do que fazer discursos onde o desejo fala mais alto do que a realidade, o Governo tem que fazer a sua parte do trabalho de casa e dar o seu contributo para um crescimento que possa ser duradouro no futuro. Se o fizer bem, já não faz pouco.

2. O terrorismo laboral não é um exclusivo de certos patrões. Alguns trabalhadores e sindicatos também conseguem atingir níveis indecorosos na defesa daquilo que julgam ser os chamados "direitos adquiridos". O que se está a passar nos últimos meses no Metro de Lisboa é um bom exemplo disso. Sucedem-se as greves, cirurgicamente marcadas para períodos de hora de ponta com o objectivo de transtornarem mais e serem notadas por maior número de pessoas. O que é pena é que a generalidade dos utentes não perceba o que está em causa nesta reivindicação dos trabalhadores do Metro. Protestam porque estão contra a revisão do acordo de empresa actualmente em vigor e querem prolongá-lo até 2011. E o que querem os trabalhadores da empresa manter? Um regime de férias que chega aos 36 dias e meio úteis por ano (recusam reduzir para 28 dias e meio, contra os 22 que a generalidade dos trabalhadores têm); períodos de trabalho diários de seis horas, divididos em dois períodos de três horas em que um deles é passado sem conduzir; prémios de produtividade automáticos (isto é, desligados da produtividade...) de 12 cêntimos por quilómetro percorrido e pago mesmo em relação ao 13º e 14º meses; e outras regalias e subsídios que transformam a gestão de qualquer empresa numa aventura que só pode acabar mal.
Mas o Metro é uma empresa do Estado e, por isso, não vai à falência. O prejuízo anual de 160 milhões de euros é pago, claro está, pelos contribuintes. Muitos destes têm sido deixado apeados várias manhãs por um pequeno grupo de trabalhadores que acha que eles têm a obrigação de pagar todos os seus 36 dias úteis de férias por ano. Trinta e seis dias e meio, para ser mais rigoroso. Se isto não é um ultraje, então o que será? Paulo Ferreira