Agência Ecclesia - 12 Jan 06

Procriação Medicamente Assistida serve para tratar, não para responder a caprichos
Walter Osswald lembra que a dimensão terapêutica é essencial para entender as técnicas da PMA

 

O debate sobre a Procriação Medicamente Assistida (PMA), na sociedade portuguesa, está a esquecer a dimensão terapêutica da mesma. Quem o assegura é Walter Osswald, Director do Instituto de Bioética da UCP e antigo responsável pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.
“A técnica de PMA é uma terapia, um tratamento para uma doença, e quem deve ter acesso a ela são os doentes”, explica à Agência ECCLESIA.
Este responsável considera que a dimensão terapêutica da PMA é central e tem sido “esquecida” no debate da sociedade portuguesa e mesmo em documentos importantes da Igreja, como a “Donum Vitae”, Instrução da Congregação para a Doutrina da Fé (22.2.1987) sobre o respeito pela vida humana nascente e pela dignidade da procriação.
O entendimento desta dimensão ajudaria a iluminar, segundo Walter Osswald, questões como o recurso a dadores de esperma e de óvulos, as mães de substituição e a utilização destas técnicas por casais homossexuais.
“Na minha opinião, só pode ter acesso à PMA uma união estável entre homem e mulher, na qual se que sofra com a esterilidade - porque nem todos sofrem com isso e não querem mesmo ter filhos -, o que exclui automaticamente os homossexuais, estéreis pela sua própria condição, dado que um homem ou uma mulher não podem ter um filho sozinho”, indica, explicando que esta posição “não tem a ver com pontos de vistas morais, nem de Igreja, nem de religião, simplesmente é um ponto de vista médico”.
A PMA está, assim, destinada a ser “uma acção terapêutica importante” para curar uma doença, concepção que explica, ainda, a rejeição de utilização de gâmetas fora do casal. “Essa utilização implicaria que o médico não estaria a curar a esterilidade, a procriação não seria assistida, mas inventada, porque não se corrigiu o erro da natureza”, precisa Walter Osswald.
O especialista distingue este caso dos casos de adopção, frisando que nesta última “há transparência completa e os pais estão em condições de igualdade”.

Embriões excedentários
O problema mais conhecido, nas técnicas de procriação médica, é o dos cahamados “embriões excedentários”. Walter Osswald não tem dúvidas em afirmar que “todas as soluções existentes são más”, pelo que defende que “em princípio, deveríamos evitar criar mais embriões do que aqueles que serão implantados”, apesar de reconhecer que isso é, tecnicamente, difícil de conseguir.
“Aquilo que se pretende eticamente é que o número de embriões seja o mais pequeno possível: há várias ideias que podem ser colocadas em prática, como não fecundar todos os óvulos recolhidos, em vez de seleccionar os que se consideram ‘melhores’, algo aliás que não é possível”, aponta.
A proposta de lei vetada por Jorge Sampaio há sete anos previa, precisamente, um número máximo de três embriões e Walter Osswald concorda que a lei não deva “prever um número, dado que isso depende da técnica e das condições de cada laboratório”.
Neste momento estão na Assembleia da República, quatro projectos de lei (PS, PSD, PCP e BE) que visam regulamentar a PMA, praticada em Portugal desde 1986, mas ainda sem regulamentação.
Apesar de hoje não serem implantados um grande número de embriões, dado que a taxa de êxito chega aos 21%, há na maioria dos casos a necessidade de fazer mais do que uma tentativa. Assim, se três embriões forem implantados em dois ciclos, estaremos já na presença de seis embriões, “mas se houver êxito na primeira vez, nenhuma mulher vai querer mais de três”.
“Eticamente, seria preferível contar apenas com os embriões necessários para o primeiro ciclo, apesar de reconhecer que o tratamento hormonal e a colheita dos óvulos implica alguns riscos e inconvenientes, para as mulheres”, indica Walter Osswald.
O que fazer com os embriões que permanecem congelados e não serão implantados é um grande dilema ético. Em Novembro de 2005, o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida deu um Parecer o qual, no número 22, admite que o princípio do respeito absoluto pelo direito do embrião à vida e ao desenvolvimento possa sofrer uma excepção, em circunstâncias e sob condicionalismos estritamente definidos e só em referência a embriões já excluídos de qualquer outra intervenção que lhes possa salvar a vida, já precária; excepção esta que permita o seu uso em investigação científica relacionada com a biologia do embrião e com o processo de fertilização.
A nota da CEP, ontem divulgada pela Agência ECCLESIA, lembra que o embrião é “uma vida humana dotada de dignidade”, pelo que os Bispos consideram que as técnicas usadas devem evitar a existência de embriões excedentários, “mesmo destinados a uma segunda gravidez do casal”. “De nenhum modo estes embriões sejam utilizados para a investigação, enquanto vivos”, conclui o documento.
Para Walter Osswald, “os próprios casais deveriam responsabilizar-se por estes embriões”, constatando, contudo, que a maioria dos casais inférteis não volta a recorrer à PMA após terem sucesso com uma gravidez.
Este responsável considera que a nota do Conselho Permanente da CEP sobre a PMA representa um “contributo que a Igreja tem todo o direito a dar” num debate que continua em aberto.

 

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