Portugal tem leis a mais. Todos o sabem e todos o
dizem. No entanto, por um estranho fenómeno,
continua a legislar-se cada vez mais, mesmo sobre
assuntos ridículos
O Estado criou a ASAE e a ASAE recriou um país
diferente daquele que tínhamos. É certo que um país
mais limpo e asseado, mas em contrapartida um país
ridiculamente vigiado. Como era de esperar, ao fim
de algum tempo começaram a chover críticas, a
maioria delas razoáveis. As bolas de Berlim não
podiam ser vendidas como sempre; as cozinheiras não
podiam congelar os salgados, como sempre; alguns
produtos regionais não podiam ser consumidos, como
sempre.
Então, o Estado teve outra ideia fabulosa: decidiu
fazer um levantamento dos produtos tradicionais que
necessitem de um enquadramento específico. Foi
aprovado esta semana no Parlamento um grupo de
trabalho que se dedicará a essa momentosa questão.
De acordo com um deputado do PS, esse grupo vai
saber quais os produtos que necessitam de condições
especiais para a sua produção, transporte ou
comercialização normais.
Ou seja, traduzido em português corrente, o grupo de
trabalho vai dizer quais os produtos que não ficam
sob a alçada dos regulamentos da ASAE - isto é,
quais as excepções à regra.
Ora aqui está uma solução engenhosa para o excesso
de leis e de regulamentos: fazer mais leis e
regulamentos que limitem as leis e regulamentos já
feitos. É um encadeado interessante e que, com
imaginação, pode ser levado ao infinito.
É extraordinário, num país onde toda a gente sabe e
afirma que há excesso de leis, a existência desta
espécie de legisladores compulsivos. E a existência
das célebres excepções, buracos e contradições
legais pelos quais entram o favor, a pequena
corrupção, o golpe.