"Sim" à frente mas com margem mais reduzida em
relação à última sondagem
O "sim" está em quebra. Embora nem todos os votos
perdidos do "sim" tenham passado para o outro lado
da barricada, a sondagem da Intercampus, para o
PÚBLICO, TVI e Rádio Clube Português, indica que os
últimos dias da campanha do "não" conseguiram
cativar jovens adultos, casados e até alguns
apoiantes do Bloco de Esquerda. Por Nuno Sá Lourenço
No limiar da vitória do "sim", esta é a leitura que
se pode fazer da sondagem da Intercampus para o
PÚBLICO, TVI e Rádio Clube Português. 54 por cento
de intenção directa de voto manifesta-se a favor do
"sim", enquanto 33 por cento diz ir votar "não".
A sondagem indica uma perda de intenção de voto no
"sim". Na anterior sondagem essa resposta chegava
aos 60 por cento. Uma vez que a margem de erro da
sondagem se situa nos 2,5 por cento, o "sim" fica
muito próximo dos 50 por cento. Além disso, é
preciso ter em conta que a sondagem acabou de se
realizar na passada terça-feira, não abrangendo os
últimos três dias de campanha. Ou seja, a aparente
certeza de vitória garantida, pode não ser tão certa
assim.
A Intercampus detectou ainda um dado significativo.
O "sim" perdeu mais terreno nos adultos com idades
compreendidas entre os 25 e 34 anos. A campanha do
"não" parece ter conseguido mudar a opinião de um
número significativo destes jovens adultos.
Na anterior sondagem, neste escalão etário o "sim"
chegava aos 71 por cento. Agora já só se fica nos 53
por cento. Destes 18 por cento, uma parte importante
aparenta ter passado para o "não", uma vez que entre
estes votantes o "não" subiu de 21 para 32 por
cento. Uma subida de 11 por cento.
A sondagem parece apontar ainda onde estão os que
mudaram de opinião nos últimos dias. O "não"
conseguiu fazer mudar de opinião entre os casados
pelo civil e as pessoas que vivem em união de facto.
Entre os primeiros, o "não" sobe de 24 para 32 por
cento desde a anterior sondagem. Entre os "juntos",
o "não" sobe dos 17 para os 25 por cento.
Outra variável que obriga à contenção é o valor
apresentado para abstencionistas. Apenas 11 por
cento não votaram na sondagem. As taxas de abstenção
são tradicionalmente mais elevadas em Portugal.
Aliás, é precisamente essa tendência para a elevada
abstenção que tornou os dois referendos realizados
em 1998, despenalização e regionalização, não
viculativos, uma vez que não votaram cinquenta por
cento mais um dos eleitores.
Há ainda outro factor que aponta para uma possível
maior penalização do "sim" através do fenómeno da
abstenção. É que, da última sondagem para esta,
desceu o número de votantes do "sim" que afirmaram
ser sua intenção "votar de certeza" (desceu dos 69
para os 62 por cento). Pelo contrário, subiu o valor
do "não" que vai votar de certerza (26 para 38 por
cento).
Além do mais, o método de trabalho da Intercampus
também conta. Os inquiridos foram colocados perante
uma urna de voto, numa entrevista presencial. As
pessoas sentem-se coagidas a votar, perante o
entrevistador.
Reticentes em aceitar
pobreza como justificação
A sondagem tentou ainda perceber quais os motivos
que levam os portugueses a aceitar o aborto. A falta
de recursos não parece ser uma justificação
aceitável. Subiu o número de inquiridos que
consideram que "não deveria ser autorizada" a
interrupção voluntária da gravidez (IVG) nesse caso.
Também se tornou inaceitável para um número superior
de inquiridos que uma mãe aborte só porque não
deseja ter um filho.
Em contrapartida subiu o número de pessoas que
consideram que "deveria ser autorizada" a IVG em
caso de risco para a saúde psíquica da mãe, a saúde
física ou em caso de violação. Sobre a condenação de
mulheres, os inquiridos voltaram a expressar-se,
quase maioritariamente, contra as penas de prisão
nos casos em que o aborto seja ilegal. 45 por cento
acham que nem "a mulher que aborta" nem "a pessoa
que provocou o aborto" devem ser sujeitas a pena de
prisão. Ainda assim, um terço dos inquiridos
respondeu que "ambas" deviam ser sujeitas a penas de
prisão.
Apesar de tudo, os inquiridos nesta sondagem parecem
ter ficado com a convicção de que a campanha os
ajudou a decidir. Subiu o número de inquiridos -
passou de 73 para 79 por cento - que consideram ter
"uma ideia perfeitamente clara sobre se devem votar
"sim" ou "não"". Aumentou igualmente a percentagem
de inquiridos que assumiram um "interesse muito
grande" pela questão. Numa escala de zero a dez, 66
por cento optaram por colocar a questão do 7 até ao
10 (dez significando interesse muito grande).
"Não" sobe entre
apoiantes do BE
O cruzamento de respostas sobre o referendo com as
intenções de voto nos partidos indica ainda uma
perda de votos do "sim" surpreendente. Ainda que não
tenha muito peso, não deixa de ser assinalável o
comportamento dos eleitores do BE. O "sim" desce dos
89 para os 75 por cento. Mais compreensíveis são os
valores entre o eleitorado de direita. O "não"
cresce tanto no PSD como no CDS. No PSD, o "não"
passou dos 42 para os 53 por cento. No CDS, o "não"
subiu dos 41 para os 66 por cento.