Público - 16 Fev 04

"Uma em Cada Duas Baixas Não Se Deveria Verificar"

As comparticipações do subsídio de doença vão diminuir nas baixas mais curtas e aumentar para as de maior duração. O ministro afirma que o objectivo desta reforma não foi combater a fraude mas sim de justiça social porque procura diferenciar as especificidades entre uma doença prolongada, onde se gastam mais medicamentos, e uma simples constipação.

P. - Ao modificar as regras do subsídio de doença o que aconteceu é que mais de 50 por cento dos beneficiários vão passar a receber menos (os que têm baixas até 30 dias) e só uns doze por cento (os com baixas de mais de 90 dias) passarão a receber mais. Isto não é um exagero?
R. - Essa comparação não pode ser feita assim, porque as baixas com mais de 90 dias também incluem as baixas de 30 dias. Não começam ao dia 91...

P. - A verdade é que muitas pessoas, a maioria, que felizmente têm baixas inferiores a 30 dias, vão receber menos. Nuns casos a comparticipação passa de 65 para 55 por cento, noutros para 60 por cento. Isto não é uma forma de, através de uma "colecta mínima", combater as baixas fraudulentas que o sistema não consegue detectar?
R. - Há dois aspectos que não podemos separar. Um é que se as comparticipações diminuem para as baixas mais curtas, aumentam para as que duram mais tempo. Uma coisa é ficar em casa uma semana com uma gripe, outra coisa é sofrer uma doença de seis, sete meses, mais grave, com impacto mais forte no orçamento familiar. O que quisemos foi, através de uma diferenciação positiva, proteger as situações de maior impacto no orçamento das pessoas.

Por outro lado, nas baixas mais curtas o que acontecia no sistema actual era inverosímil: a pessoa tinha seis meses para entregar o certificado da baixa. Podia entregá-lo e ter voltado ao trabalho há muito. Agora tem cinco dias úteis...

P. - Isso não é de menos?
R. - Não. Se alguém está doente necessita de receber o subsídio de doença. O sistema anterior, em que se podia entregar o certificado da baixa depois de já se estar de alta beneficiava os mais ricos, os que podiam dispensar o subsídio e recebê-lo mais tarde, ao mesmo tempo que impossibilitava as inspecções. Os pobres, que precisavam desse subsídio, eram mais fiscalizados.

Mais: estar de baixa, com baixas curtas, para certos níveis de rendimentos significava receber mais do que estando a trabalhar, o que era um incentivo a não trabalhar se não se fosse apanhado.

Ora onde é que o Estado tem dificuldade em fiscalizar? Nas "baixas cometa", de uma semana, duas semanas. Uma baixa de três meses é facilmente fiscalizável. Nas baixas de curta duração o certificado quase sempre só era entregue depois do trabalhador ter alta. Mais: quando fazemos o controlo das baixas, verificamos que loga à partida dois em cada três trabalhadores de baixa nem sequer comparecem. Depois, feito o exame, verifica-se que 27,5 por cento são considerados aptos para o trabalho. Ora isto indicia que em cada duas baixas, conjugando os dois factores, uma não se devia verificar. Isto é incomportável para o país. Temos o triplo do absentismo, por doença mas não só, do que Espanha.

Mesmo assim, repito, o objectivo desta reforma não foi combater a fraude, foi um objectivo de justiça social porque é completamente diferente uma doença prolongada, onde se gastam mais medicamentos, do que uma simples constipação. Por isso é que o resultado final dos gastos com o subsídio de doença não dá uma diminuição, pois o objectivo não foi poupar mas sim distribuir melhor. Para mim trata-se de aplicar o princípio sagrado da equidade, acabar com a ideia de que se deve tratar de forma igual o que é diferente: deve-se tratar de forma diferente o que é diferente.

WB00789_.gif (161 bytes)