A União - 11 de Fev 03
Famílias Grandes
Tomaz Dentinho
Há três anos numa aula de Demografia e Desenvolvimento num curso de verão de uma
universidade americana o professor referiu um estudo que demonstrava que as
famílias tinham, de uma forma geral, os filhos que planeavam ter. Mais um, menos
um, o número de filhos planeados pelos pais à priori corresponde grosso modo ao
número de filhos que efectivamente têm à posteriori. Isto, independentemente de
haver mais ou menos acesso aos métodos contraceptivos. Espantoso. Apesar de o
senso comum vigente nos fazer querer que o maior número de filhos está associado
a uma menor disponibilidade de contraceptivos, tal presunção está
comprovadamente errada. Aliás, outra coisa não seria de esperar se partirmos da
hipótese que as pessoas são racionais não só em termos individuais mas,
tendencialmente, também em termos familiares.
Mas se assim é, então o número de filhos é função de muitos outros factores que
não a macabra possibilidade de os evitar. A maior parte desses factores são de
natureza pessoal e familiar e "do que não podemos falar o melhor é calar" como
diz o filósofo. Os outros factores são de natureza pública e dependem um pouco
de todos nós, nomeadamente das orientações que vamos dando aos nossos políticos.
A Associação Portuguesa de Famílias Numerosas argumenta que a defesa dos seus
direitos junto do Estado pode mudar os factores públicos que influenciam o
número de filhos por casal e assim minorar uma série de problemas demográficos
que afectam a sociedade portuguesa: o envelhecimento e a redução da população, o
desaparecimento de relações fundamentais como a dos irmãos, dos primos e dos
tios e, a prazo, o virtual colapso da própria sociedade portuguesa. Creio que a
questão que levantam é séria não tanto pelo colapso social que anunciam mas
fundamentalmente pela denúncia que fazem da injusta e ineficiente política
nacional sobre a família. Quando, fora de escala, falam de colapso social,
confundem-se com aqueles que anunciavam a desgraça pelo aumento populacional.
Quando, dando testemunho de si, denunciam injustiças e ineficiências, estão a
ajudar a melhorar a política para bem de todos nós. Primeiro nos descontos na
matéria tributável que será possível deduzir de acordo com o número de filhos e
de forma proporcional ou progressiva. Depois, e porventura mais importante, com
a tipologia das habitações que são autorizadas pelos municípios e que impedem a
constituição de famílias numerosas. Também pela existência de taxis de mais
lugares que possibilitem arregimentar toda a gente na mesma viatura. Certamente
no acesso ás bolsas de estudo e aos apoios à doença. Porque não começar na
Região, pois a autonomia serve para isso mesmo. Também para dar o exemplo para
fora de como se faz boa política.

|