Em 2009, o mundo pode passar por problemas ainda
mais graves que a crise do subprime
Falar de 2009 é fazer previsões para o próximo ano e
todos sabemos que os economistas têm fraca reputação
nessa tarefa.
Os meteorologistas estão em boa companhia, pois
todos sabemos que olhando o pôr do sol, para além da
sensação de bem-estar e de alguma experiência mais
metafísica, prevemos o tempo que fará no dia
seguinte com a mesma certeza que os cientistas da
meteorologia.
No entanto, os astrofísicos também estão longe de
prever grandes fenómenos singulares por mais brutais
que eles possam ser. Fazem-me lembrar a crise; em
bom rigor, tudo faz lembrar a crise.
Em boa verdade, a medicina também tem prometido
muito e feito pouco. Para além de pernas partidas e
de uma infecção bacteriológica pouco mais curam. Têm
mais capacidade para nos explicar do que padecemos
do que para curar e, muito menos, prever. Nós,
economistas (e, pior ainda, os professores de
Economia), também explicamos bem a crise, mas prever
e prevenir é para o diabo.
E, se entrarmos nos domínios da mente, psicólogos ou
neurologistas explicam tudo mas nada previnem e
muito menos prevêem. E a prova disso é ver tanto
desvairado à rédea solta, e a crise não foi evitada.
Os engenheiros têm mais sorte: fazem casas que se
seguram. Evidentemente, até haver um grande
terramoto que não é possível prever porque são
fenómenos singulares. É parecido com a crise.
Portanto, como se vê, os economistas estão bem
acompanhados nesta matéria de previsões, prevenção
e, muitas vezes, cura. É que o futuro é incerto e
para o conhecermos só podemos olhar para o passado e
esse é limitado.
Com todos os riscos de estar errado, façamos umas
previsões para 2009. Não são votos - esses são de
tudo melhor que em 2008 -, são previsões com
probabilidades e custos.
Economicamente, em 2009, o mundo pode passar por
problemas ainda mais graves que a crise do subprime.
Uma nova onda de insolvências no crédito imobiliário
nos Estados Unidos pode ainda acontecer. São
empréstimos que nada têm a ver com o subprime, mas
empréstimos a pessoas que tinham capacidade
creditícia (não necessariamente milionários) para
comprarem apartamentos e casas "na planta", na
esperança de os preços continuarem a subir e terem
alguns ganhos mais tarde. Eram pequenos
especuladores que agora entram na falência com a
queda do preço das casas.
Outro drama fora do nosso alcance de prevenção seria
a cessação de pagamentos de um país da zona euro.
Não é uma previsão, é um temor. A Irlanda andou
próximo, há bem poucos meses, e os gregos parecem
estar determinados em tal. Que Zeus lhes dê
protecção e os ilumine. E que o nosso Governo tenha
cautelas.
Ainda por resolver é a falta de crédito de toda e
qualquer espécie. Como ando a dizer há meses, o
problema não é o preço do crédito, é a sua
inexistência.
Esta é a tarefa mais urgente para resolver no início
de 2009. Não depende só do nosso Governo, longe
disso. Mas o nosso Governo pode ser parte da solução
ou parte do problema. Se se colocar na posição de
fazer muito, sem regras e sem prioridades, então vai
ele próprio usar o pouco crédito disponível e será
parte do problema. É a política do "é preciso fazer
qualquer coisa" e qualquer coisa se fará. As
empresas (e as famílias) sem crédito vão falir, mais
tarde ou mais cedo, mesmo as economicamente sãs e
rentáveis.
Se o Governo quiser fazer parte da solução, terá
antes de mais de ser realista e falar dos nossos
problemas. Ralhar com os bancos não faz parte. É
preferível entender por que é que eles não dão
crédito: eles próprios não o têm para o poder
conceder. É aí que está o problema e é aí que tem de
estar a solução e essa não vai lá com ralhetes, é
bem mais difícil.
Depois, é acabar com fantasias de défice de 3 por
cento em 2009, sem receitas extraordinárias. Como
não se fala nestas, a minha previsão é que se
avizinha qualquer coisa: eu vaticino - é uma
previsão e um temor - que um ou mais fundos de
pensões da banca passem para a esfera pública. Aí -
milagre! - temos um défice abaixo de 3 por cento,
mesmo que se gaste sem limites. Esse truque pertence
a Ferreira Leite; embora não o tenha inventado, foi
quem lhe deu o estatuto de política. Em palavras
simples, é transformar a Segurança Social num
negócio tipo Madoff: quem entra paga aos que lá
estão; quando chegar a vez deles, logo se verá. Os
poucos ganhos, tanto de estabilização orçamental
como de sustentabilidade da Segurança Social, vão
pelo cano abaixo com a desculpa da crise.
Há ainda que falar verdade quanto à recessão para
que os portugueses acreditem no Governo e, na medida
do possível, tomem medidas para a enfrentar.
Fantasias do discurso de alguns responsáveis nada
resolvem e fazem-nos temer que não saibam o que
dizem. E a desconfiança (que significa falta de
confiança) é a mãe desta crise.
Há que pensar também na era pós-crise. Se isso for
pensado, saberemos o que fazer hoje. Mas isso fica
para Janeiro. Acabou o espaço e é tempo de ir
celebrar o meu Natal. Que o ano de 2009 não seja
pior que o de 2008, esse é o meu desejo - que não
confundo com previsões. Professor universitário