Expresso - 16 Dez 06

Anteprojecto de IVG no SNS (ufff...)
Henrique Monteiro

 

Uma mulher não grávida tem direito à IVG como qualquer outra mulher

Lisboa, 12 de Dezembro de 2006

Meu caro Ministro,

Previdente como sou, dou já de barato que o «Sim» ganha no referendo sobre o aborto. Posto isto, alerto-te para as medidas necessárias nos hospitais públicos a fim de suprir as novas necessidades. Eis um ante-anteprojecto possível:

a) As mulheres que se queiram inscrever na lista para IVG do SNS deverão estar em idade reprodutiva e fazê-lo de acordo com o modelo 407/06/ES/21 à disposição nos Centros de Saúde, Hospitais e nas Lojas do Cidadão.

b) O facto de estar grávida não dá à mulher nenhuma prerrogativa adicional na inscrição, uma vez que isso seria uma discriminação inconstitucional.

c) Uma mulher não grávida tem direito à IVG como qualquer outra mulher (não sei se até os homens não deveriam ter), sendo a sua inscrição aceite.

d) As listas de espera para a IVG no SNS não podem ser superiores a dois anos. Uma lista com mais de um ano já porá em causa, de forma muito séria, o passo que se deseja dar.

e) Quando as listas de espera ultrapassarem um ano, passará a haver um sistema de sorteio. Este sistema consiste em sortear, dentro do universo de mulheres candidatas, as que podem ir interromper a gravidez a Espanha, com tudo pago e sem mais chatices. O número de sorteadas será de acordo com as possibilidades orçamentais, pelo que será variável.

f) Contra o modelo de inscrição devidamente preenchido e assinado, receberão as mulheres uma senha de ordem.

g) As senhas serão distribuídas por todas as mulheres inscritas sem distinção de sexo, idade, confissão religiosa ou estado de gravidez. Naturalmente, a maioria vai ser distribuída a mulheres que não estarão, no momento, no seu estado interessante (de qualquer modo, nalguns casos havemos de acertar). Naqueles, porém, em que a possuidora da senha não está (ainda ou já) grávida, poderá vendê-la pela melhor oferta, a partir de leilão no «e-bay» ou anúncio publicado em jornal de grande circulação.

h) Caso uma mulher seja chamada para fazer uma IVG sem estar grávida, não tem direito à sua vez quando o estiver.

i) As inscrições para a IVG podem ser feitas a qualquer momento, não dependendo do estado de gravidez de cada mulher. Isto possibilita que aquelas que ainda não estão grávidas se possam inscrever preventivamente como modo de precaver qualquer incidente que pode, ou não, vir a ocorrer.

j) Os hospitais onde há pouco foram fechados os blocos de partos podem ver-se obrigados a voltar a abri-los. Mas só se nessa zona houver um número de IVG mínimo que compense a chamada produtividade médica. Caso contrário, serão encerrados outra vez.

k) Os médicos que declarem objecção de consciência podem praticar a IVG nas clínicas privadas, uma vez que a objecção apenas diz respeito a espaços públicos, nos quais a lei da oferta e da procura não se aplica.

Esperando ter merecido a tua atenção, subscrevo-me atentamente, desejando-te os meus melhores votos.

Comendador Marques de Correia