Público - 06 Dez 06

Canção hip-hop é hino da Plataforma Não Obrigada

Maria José Oliveira

 

Defensores do "não" no referendo sobre despenalização do aborto apresentaram sondagem da Universidade Católica

 

Ele é uma estrela do hip-hop nos EUA, com um programa de comédia na MTV e muitos sites de fãs. Nick Cannon e um dos seus últimos êxitos musicais - Can I live? ("Posso viver?") - foram transformados em ícones da Plataforma Não Obrigada, criada por um grupo de cidadãos, associações e movimentos para defender o "não" no referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez.
A canção de Cannon fechou ontem a apresentação oficial da Plataforma, no Centro de Congressos de Lisboa, e, embora os organizadores não o tivessem anunciado desta forma, o tema surgiu como uma espécie de hino do movimento. O vídeo de Can I live? relata a história de uma jovem mulher grávida que, decidida a abortar, é "visitada" pelo "espírito" adulto do seu filho no momento em que os médicos estão prestes a interromper-lhe a gravidez. A jovem é a mãe de Cannon, que aparece no final do vídeo a abraçar o filho.
Apesar de Can I live? ter sido associada aos chamados movimentos "pró-vida" norte-americanos, o músico negou que a canção traduza um juízo político, como se pode ler no site oficial de Nick Cannon.
Se a música de Cannon foi uma surpresa para algumas das muitas dezenas de pessoas que encheram um dos auditórios do Centro de Congressos, o mesmo não aconteceu com os resultados da sondagem encomendada pela Plataforma ao centro de sondagens da Universidade Católica: a grande maioria dos inquiridos preferia ser "ajudada e apoiada a manter a gravidez", quando interrogada sobre o que desejaria, se estivesse grávida e atravessasse momentos de dificuldade ou dúvida.
E sobre a possibilidade de fazer um aborto quando "a mãe ou a família não têm meios para sustentar a criança" ou "quando a mulher não quer ter o filho" a maioria das pessoas (67 e 68 por cento, respectivamente) responderam não em ambos os casos.
Finalmente, à questão "quando é que começa a vida humana?", 74,9 por cento apontou "desde o momento da concepção" e "desde o momento em que bate o coração".
O site da Plataforma (não-obrigada.org) não possui a ficha técnica desta sondagem. Segundo a assessora do movimento, Inês Teotónio Pereira, o número de inquiridos foi de 1880 e a última questão foi colocada somente a mulheres.

"Tal como em 1998, o "não" vai ganhar outra vez"
Com uma identidade "apartidária e não confessional", realçou Isabel Galriça Neto, docente na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, a Plataforma Não Obrigada foi também apresentada como um grupo que "reúne um conjunto de enorme de personalidades", frisou o médico João Paulo Malta. Nas primeiras filas da sala encontravam-se António Pinto Leite, Alexandre Relvas, Maria José Nogueira Pinto, Maria João Avillez, as deputadas Zita Seabra (PSD), Matilde Sousa Franco e Teresa Venda (ambas independentes pelo PS), Nobre Guedes e Tozé Brito, entre outros.
Numa intervenção que começou por sublinhar que "em Fevereiro, tal como em 1998, o "não" vai ganhar outra vez", João Paulo Malta explicou que "o que está em causa" é "a liberalização do aborto e as pessoas decidirem sobre a morte de um ser humano".
Para sustentar a sua tese, o médico recorreu às "capacidades técnicas" que actualmente permitem "mostrar aos pais o desenvolvimento do bebé": "Às sete, oito semanas, conseguimos mostrar-lhes o coraçãozinho a bater, o sistema nervoso, as mãos e os pés a mexer."
No final das intervenções, Isabel Galriça Neto deixou um "repto" aos "responsáveis do Ministério da Saúde e do país": "Quando o "não" ganhar, o dinheiro que seria gasto a financiar clínicas espanholas deve ser investido a apoiar as famílias e as mulheres que decidem pela vida."