Jornal de Notícias - 22 Dez 03

Colo para quem desespera para dar família a uma criança

Casal que passou a angústia dos processos de adopção encabeça grupo que quer informar candidatos e denunciar deficiências do sistema Nova lei ainda só é uma esperança

Helena Norte

Depois de terem passado por três desgastantes processos de adopção, José Esteves Aguiar e a esposa resolveram criar, em conjunto com outras pessoas que viveram a mesma angústia, uma associação para apoiar os candidatos à adopção. Para que não desistam nem mergulhem no desespero das dificuldades, incompetências e insensibilidades que vão encontrar quando querem dar um colo a uma criança abandonada.
"Há muitas crianças que podiam já estar adoptadas, se os técnicos da Segurança Social, as instituições de acolhimento e até os tribunais procurassem encaminhá-las nesse sentido. Muitas vezes, não há consentimento dos pais biológicos porque ninguém se preocupa em procurá-los", afirma Esteves Aguiar.
E justifica: "A maioria dos pais das crianças institucionalizados não mantém sequer um contacto mínimo com os filhos. Aparentemente, ninguém se preocupa em passar essa informação para que os tribunais decretam a confiança judicial para adopção. "Os serviços carecem de profissionalismo e humanidade", sublinha, acrescentando que "até parece que as crianças são mantidas, nalgumas instituições, mais tempo do que o necessário, por forma a justificar a sua sobrevivência". A criação de uma base nacional - que agregue informação sobre as crianças para adopção e dos candidatos - é, na perspectiva deste pai e advogado, uma medida que poderá contribuir para "retirar o poder absolutista que, actualmente, os centros distritais detêm" e um passo importante no sentido de se gerir com mais eficácia e justiça, a nível nacional, todos processos. "É fundamental que haja transparência e que a entidade fiscalizadora funcione realmente porque a nova lei consubstancia melhorias consideráveis se for bem aplicada", reforça.
A esposa critica principalmente a falta de apoio e de informação por parte dos serviços de adopção. A Colo - Associação Portuguesa de Apoio à Adopção ainda não está formalmente constituída (falta fazer a escritura, mas os órgãos sociais estão constituídos) e já recebe dezenas de pedidos de ajuda, por e-mail, de casais desesperados, depois de anos e anos, de espera numa lista em que não sabem sequer que lugar ocupam "No distrito do Porto, disseram-me que havia cerca de 300 candidatos, mas nunca ninguém assume nada. Desde que a nova lei foi publicitada, o número cresceu, em média, 90 por mês."
"A ideia da associação surgiu precisamente para apoiar as milhares de pessoas que querem dar uma família a uma criança sem lar. Por vezes, basta uma informação, uma palavra de apoio. Para que não desistam. Porque compensa", garante. "Vamos ter um conselho consultivo muito atento para denunciar más práticas e apresentar propostas para melhorar a qualidade dos serviços de adopção", acrescenta o marido. "Muitos técnicos são típicos funcionários públicos: cumprem as obrigações mínimas e são incapazes de tentar agilizar um processo sabendo que, cada dia que passa institucionalizada, é um dia de felicidade perdida para uma criança".

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