Portugal Diário - 16 Dez 03
De olho em quem despede grávidas
Tatiana Alegria
Nova lei obriga empregadores a comunicar a não renovação dos contratos ao
Estado
Um patrão pode mandar embora uma trabalhadora grávida com contrato a termo
certo sem dar qualquer satisfação. No entanto, a partir de agora, a CITE,
Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, vai passar a saber
quem é que manda mulheres à espera de bebé para a rua.
Uma nova disposição legal do Código de Trabalho exige que o patrão
comunique a não renovação do vínculo laboral à Comissão.
Grávidas mais protegidas?
Josefina Leitão, Presidente da CITE, explicou ao PortugalDiario que não se
trata de uma maior protecção jurídica às grávidas que ainda não fazem
parte dos quadros, mas um mecanismo para «averiguar se existe ou não
discriminação. Se houver muitos casos de caducidade destes contratos
podemos combater directamente o problema», acrescentou.
É que para um empregador despedir uma grávida com um contrato efectivo, a
lei exige um parecer prévio da CITE. Como explicitou Josefina Leitão, «a
lei consagra a presunção de que o despedimento da grávida é feito sem
justa causa», portanto cabe ao empregador eliminar essa presunção. Dos 23
pareceres prévios pedidos à CITE, este ano, 16 opuseram-se ao despedimento
das trabalhadoras grávidas.
Mas este parecer prévio não é exigido se o patrão quiser mandar embora uma
grávida com contrato a termo certo. Um advogado, especialista em direito
de trabalho, deixou bem claro ao PortugalDiario quão frágil é a protecção
da mulher grávida que trabalha a termo certo: «Eu disse à minha mulher
quando ela começou a trabalhar: «Durante estes primeiros três anos não há
filhos para ninguém».
Isto porque o patrão não tem que explicar porque é que não renovou o
contrato. Uma grávida pesa sempre mais à entidade patronal. Tem mais
direitos e menos obrigações do que as outras trabalhadoras e, de uma
maneira geral, é menos produtiva. Portanto, se um patrão tiver de escolher
entre despedir uma mulher que engravidou e outra que não quer ter filhos,
optar por mandar embora a primeira poderá ser aliciante.
O PortugalDiario sabe que uma mulher celebrou um contrato com uma
importante empresa de telecomunicações em Portugal, em que se comprometeu
a não engravidar durante os primeiros três anos na empresa, ou seja,
enquanto não fizesse parte dos quadros. Filipe Azóia, especialista de
direito de trabalho, explicou ao PortugalDiario que a entidade patronal
tem sempre o direito de não renovar um contrato a termo. «O empregador não
tem que fundamentar a não renovação. A justificação apresentada pela
entidade empregadora [neste caso] seria considerada não escrita»,
adiantou.
Já Josefina Leitão, discordou desta interpretação, salientando que uma
trabalhadora grávida, enquanto o vínculo laboral persistir, está sempre
protegida por lei. «Este contrato está a discriminar com base no sexo. Se
a mulher tivesse ficado grávida e o patrão não tivesse renovado o
contrato, ela poderia fazer queixa à Inspecção-Geral de Trabalho ou à
comissão».
A porta-voz da CITE acrescentou que «uma trabalhadora grávida com contrato
a termo certo só tem de provar que a razão pela qual o vínculo laboral se
desfez foi a gravidez. Ora, neste caso, o próprio contrato teria efeito de
prova».
Provar a discriminação
A questão é que provar a razão por detrás destes despedimentos nem sempre
é fácil. Irina tem 31 anos, é empregada doméstica e tem um contrato a
termo certo. Já disse ao patrão que está à espera de um filho, porque «já
não o consegue esconder». Mas tem medo que ele não renove o contrato em
Fevereiro.
«Mas o que é que eu posso fazer? Não vou fazer um aborto. Se ele me
despedir, vou falar com advogados», desabafou ao PortugalDiario.
Mas a mulher ucraniana está confiante que o patrão não a mande embora. «Eu
posso trazer o meu bebé para o trabalho e o patrão não vai ser
prejudicado». Já quem não tem essa facilidade pode não ter tanta confiança
em engravidar com um contrato a termo certo. |