Público - 16 Dez 03

Falta de Avaliação dos Manuais Motiva Queixa Contra Ministério da Educação
Por ISABEL LEIRIA

A lei que obriga o Ministério da Educação (ME) a garantir a avaliação científica e pedagógica dos manuais escolares tem mais de dez anos, mas tem sido sucessivamente violada pelas vários governos. A Federação Nacional de Ensino e Investigação (FNEI) entende que é altura de "dizer basta" e entrega hoje na Provedoria de Justiça uma queixa contra a tutela por incumprimento do decreto-lei de 1990 que regula os manuais escolares.

Diz o diploma que o ME tem de "constituir comissões científico-pedagógicas para apreciação da qualidade dos manuais escolares, com excepção dos relativos à disciplina de Educação Moral e Religiosa". O próprio programa do actual executivo assume a necessidade de estruturar "um sistema que avalie e incentive a qualidade pedagógica e científica dos manuais escolares", lembra o presidente da Direcção da FNEI, Carlos Chagas.

Por isso, das duas uma, "ou o Governo mantém o decreto-lei e cumpre-o ou, na sua legitimidade, altera a legislação e cria outros princípios que avalizem a certificação dos manuais", defende Carlos Chagas. Para o dirigente sindical, não faz qualquer sentido atribuir aos professores a competência de apreciar os livros, sem que haja qualquer indicador prévio sobre a qualidade científica e pedagógica dos mesmos.

"Os docentes não têm tempo, não são especialistas e deviam decidir só depois de saberem que os materiais que lhes chegam às mãos têm qualidade. Tal como está, o processo está invertido. Os editores e livreiros é que estão a definir a qualidade mas, enquanto empresas que visam o lucro, propagandeiam sempre que o seu é o melhor", lamenta a FNEI. O problema é tanto mais grave, continua Carlos Chagas, quanto os manuais escolares representam parte significativa do sucesso educativo dos alunos.

"Não se pode perpetuar uma situação de completa irresponsabilidade sobre a qualidade dos manuais escolares", pelo que a FNEI, na queixa apresentada hoje, requer ao Provedor de Justiça que recomende ao ME ou a "reposição da legalidade" e o cumprimento da lei, ou a sua "substituição por um diploma" que concretize estas preocupações. A federação apresenta a sua proposta e defende a certificação prévia.

O facto de existirem 2105 títulos disponíveis neste ano lectivo - mais de 1300 para o ensino básico - tem sido um dos argumentos invocado pela tutela para justificar a inexequibilidade de uma avaliação prévia ao momento de adopção por parte das escolas.

Mas se o ME teria dificuldade em assumir o processo, o trabalho que os professores têm de fazer de quatro em quatro anos ou de três em três (período de vigência dos manuais do 1º ao 6º anos e do 7º ao 12º, respectivamente) não se revela mais simples. Em final de ano lectivo, um docente do 1º ano que queira apreciar todos os títulos disponíveis no mercado para Língua Portuguesa, Matemática, Estudo do Meio e Expressão e Educação Plástica - as disciplinas que constituem o currículo - terá de avaliar mais de uma centena de manuais. Só para Português existem quatro dezenas.

Aos serviços do ministério chegam depois as grelhas de apreciação qualitativa preenchidas, em cada estabelecimento de ensino, para cada livro apreciado. O manancial de informação é enorme, mas acaba por não ser trabalhado pelo ME.

WB00789_1.gif (161 bytes)