São
“resultados humilhantes” e revelam “a inaptidão da sociedade para
aceitar alterações a nível comportamental”. Seja dos governos, das
famílias, dos professores ou da escola. É assim que António Manuel
Baptista, professor catedrático jubilado de Física e fundador da
Sociedade Portuguesa de Medicina Nuclear encara os péssimos resultados
da segunda e última fase dos exames do 12.º ano.
Um problema cuja responsabilidade diz ser geral e para o qual, adianta,
devem ser encontradas “soluções pequenas, mas radicais”. De resto, foi
este tipo de propostas que António Manuel Baptista fez quando presidiu à
Comissão para a Promoção do Estudos da Matemática e das Ciências, uma
estrutura criada pelo ministro cessante, David Justino, e que o
catedrático viria a abandonar em conflito com os restantes membros.
“Estamos fartos de reformas”, diz em declarações ao CM, frisando que os
políticos – todos eles, de esquerda, da direita ou do centro – “estão
subjugados a interesses que não têm nada a ver com os interesses da
sociedade”. Adianta que “não tem havido coragem” para levar por diante
pequenas alterações e mostrar ao País que existe determinação”. Em
resultado dessa actuação, sublinha “estamos a ser estupidificados há já
várias gerações”.
A REALIDADE DAS PAUTAS
Com esse tipo de políticas, frustram-se muitas expectativas, sobretudo
as dos alunos que ontem correram a espreita as pautas. As notas lá
estavam, a maioria revelou um descalabro total. Os piores resultados
mantêm-se ao nível das Ciências, com as disciplinas de Física (6,2
valores) e Matemática (6,8 valores) a revelarem as médias mais baixas da
segunda fase de exames. A cadeira de Português (A e B) contrariamente ao
habitual também se ficou pela negativa. Comparativamente com o ano
passado, há uma descida generalizada das notas. Das 21 disciplinas com
maior número de inscrições, 18 têm média negativa.
FALTA DE EXIGÊNCIA
Resultados que a Confederação das Associações de Pais (Confap) diz
reflectir a falta de exigência nos anos anteriores. “Já correspondem a
um número muito baixo de alunos que sobrevive e chega ao 12.º ano”,
sublinha Albino Almeida, presidente da Confap, adiantando que as
“sucessivas reformas limitam-se a plasmar as ideias dos ministros”. Em
resultado disso, “temos currículos inaceitáveis”
Para o representante dos pais, o que os estudantes precisam é de tempo
para aprender e ser ensinados. “Precisam, sobretudo, de estabilidade nas
escolas e de um corpo docente motivado”.
“E precisamos também de coragem”. De novo António Manuel Baptista
expressa a sua opinião para frisar que os maus devem ser penalizados e
os bons recompensados.
“Se alguns alunos tiverem de reprovar, que assim seja, mas não se pode
prejudicar aqueles que têm capacidade para atingir um nível superior”.
Sugere por isso algumas alterações: concentrar as atenções no
pré-escolar, mexer no Ensino Básico e decidir quais as diciplinas que
são fundamentais no Secundário.
O insucesso dos alunos portugueses, sobretudo nas disciplinas de
Matemática e de Física, já havia sido revelado no âmbito de um estudo
organizado pela OCDE (PISA) e que envolveu 256 mil estudantes de 32
países. Em Matemática, Portugal partilha o penúltimo lugar da
classificação, a par da Polónia, Itália, Grécia e Luxemburgo. Apenas o
México é pior que nós. Em Ciências, só os alunos do México e do
Luxemburgo ficam atrás.
DESCIDA GENERALIZADA DAS NOTAS
À semelhança dos anos anteriores, as notas da segunda fase dos exames do
Ensino Secundário são mais baixas do que as da primeira fase. Em relação
ao ano passado registou-se uma descida das notas.
Dados do Ministério da Educação permitem concluir que as notas baixaram
em 12 das 21 disciplinas com maior número de alunos internos inscritos.
As médias mais baixas são as de Matemática (6,8 valores), Física e
Alemão (ambas com 6,8). A descida das médias é uma constante. Em
Português A, a média foi de 9,7 valores (contra os 10,2 do ano
transacto). Português B teve uma média de 9 valores, menos sete décimas
do que em 2003. O maior desastre verificou-se na disciplina de Desenho e
Geometria Descritiva A: a média de 12 valores em 2003 caiu para 8,7 este
ano.
ERRO EM HISTÓRIA E ADENDA NA MATEMÁTICA
Os exames de História e Matemática deram que falar. Na prova de
História, onde o rigor histórico é fundamental, a última questão do
teste pedia um comentário a uma mensagem do Presidente da República,
Costa Gomes, de Janeiro de 1977. Mas nessa altura a presidência era
exercida por Ramalho Eanes! O Ministério da Educação (ME) reconheceu o
erro mas desvalorizou a polémica, pois o que se pretendia era um
comentário no contexto da institucionalização da democracia em Portugal.
No caso da Matemática, a Federação Nacional de Professores acusou o ME
de ter enviado uma adenda alterando os critérios de correcção, o que
segundo a Fenprof revelou “desorientação e incompetência”. O Ministério
disse que não alterou as regras e que todo o processo já estava
combinado com os professores supervisores.
Por que falharam os alunos nos exames de acesso ao ensino superior?
FERNANDO SILVA, 21 ANOS - LISBOA
“O professor de Filosofia não nos preparou como devia ser e por isso eu
tive 8 neste exame. Na primeira fase também tive azar – não me deixaram
entrar na sala onde ia realizar-se o exame só porque cheguei com dois
minutos de atraso. E chumbei.”
CRISTINA ALVES, 20 ANOS - PORTO
“Os exames não me correram bem em relação ao esforço que fiz. Em Química
obtive positiva, a Matemática correu mal, na primeira e na segunda
chamada. Não obtive os 9,5. Dedicarei o próximo ano a fazer as
específicas. Está tudo adiado para Junho de 2005.”
JOÃO PINTO, 18 ANOS - BRAGA
“A nota do exame de Física, 7, faz descer a média para 13 e complicar as
contas. Acabaram com os exames em Setembro, mas podiam assegurar no novo
calendário mais tempo a mediar as provas, porque ficaram todas em cima
umas das outras. Foi tudo a correr.”
ANDREA CRISTINA, 17 ANOS - VISEU
“O exame de Matemática, 5, correu muito mal. Estava preparada, mas
quando vi a figura geométrica assustei-me, não consegui raciocinar e,
por motivos que não consigo explicar, bloqueei. A culpa também deve ser
do sistema educativo. É de todos, de nós, dos professores.”
NUNO MIRANDA, 19 ANOS - ÉVORA
“Reprovei a três disciplinas: Geologia, Biologia e Matemática. Queria
tirar um curso superior de desporto, mas vou ter que aguentar mais um
ano. Até tivemos tempo para nos preparar, mas a quem é que apetece
estudar no mês de Julho com este calor?”
CRITINA GALEGO, 18 ANOS - FARO
“Não sei porquê mas fiz este exame de Matemática melhor do que o outro.
Estudei mais e correu bem. Embora tenha tido 8, consegui passar.
Relativamente às notas terem descido agora, penso que a realização do
Euro nesta época terá contribuído para isso.” |