Público - 26 Abr 08

 

A família no Código do Trabalho
Glória Rebelo

 

Existe no plano laboral uma verdadeira lacuna na defesa especial dos familiares ascendentes

 

As recentes propostas apresentadas para revisão do Código do Trabalho - que assumem como objectivo central "promover um novo compromisso social" - reforçam, muito oportunamente, a tutela da família, em particular (e acautelando, concomitantemente, a igualdade de oportunidades) aumentando de cinco para dez dias úteis a licença a gozar obrigatoriamente pelo pai por altura do nascimento do filho e, paralelamente, propondo a remuneração a 100 por cento dos dias opcionais de licença a gozar pelo pai em simultâneo com a mãe. Contudo, a reforma em curso não deverá ignorar que será de idêntica justiça tutelar também, especificamente, a assistência à família ascendente.

 

Pensar seriamente o envelhecimento em Portugal é um tema particularmente importante para o desenvolvimento do país, tanto mais que enfrentamos um desafio inédito: com uma taxa de natalidade média abaixo do valor mínimo para a renovação da população (cerca de 2,1 filhos por casal), Portugal é já um dos países mais envelhecidos da União Europeia. A verdade é que, a nível nacional, os números revelam uma realidade social nova: a par de um forte decréscimo da taxa de natalidade e de um adiamento da maternidade (se, em 1960, o número médio de filhos por mulher era superior a três, em 2006 o número era apenas de 1,35 filhos por mulher), assistiu-se, nas últimas duas décadas, a um acentuado envelhecimento da sociedade portuguesa. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, a população portuguesa com oitenta e mais anos de idade aumentou 35 por cento, entre 1990 e 2006.

 

E se as políticas de apoio à família passam pela expansão da rede de equipamentos sociais, designadamente de creches e infantários, centros de actividades ocupacionais, lares de idosos ou centros de apoio domiciliário, estas também devem incluir, claramente, um reforço da tutela jurídico-laboral da maternidade e da paternidade, assim como da família ascendente, apresentando soluções no plano da conciliação entre a vida familiar e profissional.

 

Em Portugal urge reedificar a nível nacional as políticas de família através de um conjunto de novas políticas públicas sociais especificamente vocacionadas para os desafios ao apoio a esta instituição primordial. Assim, e porque um país que não investe no bem-estar das famílias - núcleos de socialização primária que formam a personalidade básica de cada um, que introduzem e fundam nos indivíduos regras que são duráveis - não pode, a médio prazo, ambicionar um desenvolvimento sustentável, é, portanto, também necessário que, em pleno processo de revisão do Código do Trabalho, o Governo e os outros parceiros sociais não ignorem a importância do fenómeno do acentuado envelhecimento da população portuguesa e, em especial, de uma adequada protecção da família no sentido ascendente.

 

No plano laboral - legal e convencional - existe uma verdadeira lacuna na defesa especial dos familiares ascendentes, pelo que urge preencher esse vazio. Até porque, sendo o Código do Trabalho um instrumento de promoção de valores e de interesses reconhecidos como fundamentais para a sociedade portuguesa e, ainda, um importante meio de conformação das relações colectivas de trabalho, é recomendável que o alargamento da tutela da família chegue, a partir deste documento, também à contratação colectiva. Professora universitária