Público - 8 Abr 03

O Que Mudou na Reforma Anunciada

O que está em causa?

A tributação do património imobiliário constitui uma das grandes entorses do sistema fiscal português, sucessivamente adiada desde 1989, quando Cavaco Silva era primeiro-ministro. O regime fiscal está assente em matrizes prediais completamente desactualizadas e pouco aderente à realidade. Isso faz com que, anualmente, se alargue o fosso entre a tributação de imóveis "velhos" e "novos". Segundo os valores oficiais, um por cento dos prédios paga 30 por cento da carga fiscal e metade dos imóveis pagam 1,4 por cento da receita. Há 17 milhões de imóveis, muitos milhões estão isentos. Essa desactualização levou a que a tributação das transmissões (sisa) tenha sido sucessivamente agravada, para a compensar. Em 2002, cobrou-se 623,5 milhões de euros de contribuição autárquica e 663,5 milhões de sisa, o que torna impossível às autoridades prescindir dela, mesmo que seja "o mais estúpido imposto do mundo". Acresce a este problema o dos proprietários de imóveis comprados nos últimos anos que começam a entrar no período final de isenção.

A reforma mudará alguma coisa?
Sim, mas apenas parcialmente. O Governo opta por criar um sistema dualista. De um lado ficarão os "novos" e os "velhos" imóveis transaccionados a partir de 1 de Janeiro de 2004; do outro, ficarão os "velhos" imóveis que não serão transaccionados a partir dessa data. Para os primeiros, a tributação sofrerá alterações razoáveis. Para os segundos, a sua situação tributária será menos agravada até que sejam vendidos. Nessa altura, aplicam-se os novos métodos e a tributação pulará. Mas tudo dependerá do gradualismo a preconizar pelo Governo e que ainda se desconhece.

Mas concretamente como vai ser?
Concretamente, e para o primeiro grupo de imóveis, os imóveis vendidos serão objecto de uma avaliação com base em critérios, ponderados, semelhante ao que fora proposto em 1999 pela comissão presidida por Henrique Medina Carreira. De acordo com documentos oficiais, ter-se-á em conta a área, a localização, a qualidade e conforto e a idade do imóvel.

E como será feita essa avaliação?
Será feita de forma automática com base em ponderadores, segundo o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Mas não se sabe como. Se o valor declarado para a venda for inferior ao resultado dessa avaliação, a tributação sobre a venda - bem como sobre a futura posse desse imóvel - será feita com base nesse valor. O Governo garante ainda que, nesse caso, essa avaliação será registada na contabilidade da entidade vendedora. O Governo alega que esse é um mecanismo de luta à fraude e evasão fiscais. Para o segundo grupo, o Governo apenas actualizará os valores que estiverem nas matrizes, com base na inflação.

E houve alterações nas taxas?
Houve. Daquilo que se conhece, as vendas de imóveis realizadas a partir de 1 de Janeiro de 2004, passarão a ser tributadas por um novo imposto municipal sobre as transmissões (IMT), em substituição da sisa. É o mesmo objecto, mas a taxa máxima baixa de 10 por cento para seis por cento. Não se sabe ainda as outras taxas. Foi dito que a taxa máxima deixa de ser aplicada para imóveis de valor superior a 70 mil euros para se aplicar a valores acima de 500 mil euros. Imóveis abaixo de 80 mil euros não pagam, quando esse limite era de 61 mil euros. Imóveis para arrendamento e segunda habitação terão um agravamento de um ponto percentual. Escritórios e prédios para indústria e comércio pagam uma taxa de cinco por cento no caso de imóveis rústicos (actualmente é de oito por cento) e de 6,5 por cento no caso de urbanos (actualmente é de dez por cento). A posse desses imóveis - antes tributada pela contribuição autárquica e futuramente tributada pelo imposto municipal sobre imóveis (IMI) - dependerá da idade dos imóveis. Os imóveis tidos como novos pagarão entre 0,2 e 0,5 por cento do valor inscrito na matriz e os restantes entre 0,4 e 0,8 por cento. Actualmente paga-se entre 0,7 por cento e 1,3 por cento de CA.

Mas pagar-se-ão menos impostos?
Não. Nas contas oficiais, cerca de 70 por cento dos contribuintes vão pagar mais e, em termos gerais, a carga fiscal vai aumentar. Mas é admissível que passe a verificar-se uma redistribuição dessa carga fiscal, dada a enorme subavaliação dos valores. Aqueles que são proprietários de imóveis há algum tempo verão os valores das matrizes aumentadas e brevemente pagarão mais impostos. Se os venderem, os valores serão avaliados e tributados em conformidade. Aqueles que comprarem imóveis a partir de 1 de Janeiro de 2004, pagarão menos, em termos fiscais, pela compra e pela posse, do que pagariam no passado.

Deve-se adiar a compra de casa?
É uma boa pergunta que cada um terá de avaliar, caso a caso. Actualmente vive-se uma recessão pelo que os preços deveriam descer. Se esperar para 2004, por forma a beneficiar da redução do imposto sobre as transmissões, poderá ver os preços mais elevados. Os construtores temem que, na verdade, se verifique um compasso de espera.

J.R.A.

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