Público - 23 Abr 03

Aos Copos!
Por JOAQUIM FIDALGO

É bom beber um copo com os amigos, as amigas. E quem diz um copo, diz dois, quem sabe três, se a noite for mais longa, a conversa boa, a música de jeito, o estar-se bem. À volta de uma mesa, em torno de um copo, seja lá pela esplanada de fim de tarde, seja cá pelo bar de noite e meia, o tempo flui melhor, os corpos soltam-se, as palavras também, o coração até fica mais aberto, pronto, está-se bem.

Mas ir com os amigos, as amigas, beber um copo, é uma coisa; ir beber copos, copos em primeiro, e depois talvez amigos sim ou não, já nem importa, é outra coisa. Eu acho.

Está a abrir a época dos copos no meio estudantil universitário. Mais do que dos copos, a época das bebedeiras, só porque sim, só porque é costume, só porque sem bebedeira nem é "queima" nem é nada. Para uns, uma espécie de baptismo, qualquer coisa de rito iniciático para passagem a um estádio mais veterano. Para outros, o reencontro com uma semana inteirinha de "margem de certa maneira". Para tantos, apenas uma imparável sucessão de copos que se exibem vazios como troféu de batalha, eu bebi mais do que tu, agora bebe tu mais do que eu, e lá ao fundo toca quem?, o Quim, sim, o Barreiros?, ou será o outro, como é que se chama?, o que não sabe cantar, o não sei quê da Cabra, pois é, se calhar só com muito copo é que se aguenta, saia mais uma rodada!

Gosto muito de beber um copo com os amigos, as amigas, entendamo-nos quanto a isso. E quem diz um copo, diz dois, quem sabe três. E às vezes até, sabe-se lá, já aconteceu... Mas bebedeira por propósito, bebedeira como condição, copos à frente, copos primeiro, copos copos e o resto se verá, isso não. Quer dizer, acho eu.

A coisa já está tão bem montada (porque é que os grandes mecenas das festas dos estudantes são sempre as empresas de copos?) que até é difícil escapar-lhe às boas. Um dia destes, ofereceram-me um folheto de propaganda de um café-bar que se prepara para a tal época. A jeito de aperitivo (sim, que a "queima" ainda só vai no adro...), oferecia umas promoções. Mas não punha as bebidas mais baratas, tipo um fino (em Lisboa chamam-lhe "imperial") a trinta em vez de cinquenta cêntimos, não senhor: oferecia mas é mais bebidas pelo mesmo preço, assim "seis finos, um euro e meio". Seis finos, logo seis. Ou então whisky. Um whisky mais barato, ou um segundo de borla? Não senhor. Quatro whiskies, quatro, assim por junto, e todos só por cinco euros. Ou então vodka. Mas um para que dá? Saiam também quatro-vodkas-quatro, e por cinco euros também, que os estudantes são gente de muita sede. Que niquice são quatro vodkas, quatro whiskies, seis finos?, por aquele preço até dá para repetir a dose.

Os bares é que sabem, e os cafés, e as discotecas e assins. Se é para a bebedeira, pois então bebedeira e meia, e ao preço da uva mijona, ganha-se menos em cada copo, mas ganha-se muito mais nos muitos mais copos que se vendem, e a bebedeira está garantida.

"Lei da oferta e da procura", não é o que dizem que move cá esta história toda que nos passa ao lado? E nós a ver - e a beber...

WB00789_1.gif (161 bytes)