Discurso de Tomada de Posse da Coordenadora Nacional para os Assuntos da
Família
Sr.
Primeiro Ministro, Excelência
Sr.
Ministro da Segurança Social e do Trabalho
Srs.
Ministros e Secretários de Estado
Excelência
Reverendíssima, Sr. Bispo
Minhas
Senhoras e meus Senhores
Gostaria de
iniciar as minhas palavras com um agradecimento àqueles que em mim
confiaram. O vosso estímulo e encorajamento venceram as minhas dúvidas e
hesitações.
Foi
sobretudo o objectivo da tarefa pedida, que me fez aceitar esta mudança na
minha vida, que não desejei nem ambicionei.
A convicção
de que vale a pena trabalhar na promoção da família, as ideias que tenho
defendido ao longo da vida, a sintonia com o programa do Governo e o apoio
de tantos, levaram a que aceitasse este desafio que entendo como um serviço
à causa pública, à causa da família.
Um
agradecimento igualmente, aos irmãos de S. João de Deus e à casa de saúde do
Telhal, onde trabalho. Também eles compreenderam o que estava em causa e
mais uma vez, com o seu serviço e disponibilidade me libertaram horários e
tarefas.
Da medicina
á administração pública, de clínica aos programas e políticas, da terapia às
propostas e medidas. Os primeiros tempos não serão fáceis. Sendo médica
psiquiatra e terapeuta familiar de há muito que trabalho com famílias e
casais. Acredito que a experiência que trago do terreno, me ajudará a pensar
nas pessoas concretas, no quotidiano das famílias e nas suas dificuldades,
mas também nas suas múltiplas competências, que precisamos incentivar e
valorizar.
Trabalharei
a pensar em objectivos, critérios, ideias e utopias, mas atenta ao mundo em
que vivemos, com a preocupação da realidade e do dia a dia, onde tanto da
vida se constrói.
Estou aqui
hoje, porque acredito que é na família que se realiza a pessoa e é com as
famílias que se desenvolve a sociedade e o país.
Da
complementaridade homem e mulher, do amor e do compromisso surge a
conjugalidade e dela, a família.
Família –
rede de relações fortes e íntimas, núcleo de pertença, de aliança, de
filiação e fraternidade que toca a nossa afectividade mais profunda a
relação com a nossa origem, o nosso crescimento, onde se cruza o passado e o
futuro.
Quando falo
de família falo de uma realidade que nos toca por dentro. É nela que
nascemos, é nela que crescemos, é nela que habitamos e nos habita, é nela
que nos tornamos homens e mulheres. Está tão entranhada dentro de nós que
quando recordamos a nossa história pessoal e invocamos as nossas memórias
não é a nós que chegamos, mas à nossa família.
Família –
comunidade natural anterior ao Estado que atravessa a história em contextos
sociais, económicos e culturais tão diversos, e chega até nós com uma
extraordinária resistência e capacidade de adaptação. As circunstâncias que
rodeiam a família são sempre diferentes no decorrer dos tempos. A sua
sobrevivência apesar de tantas mudanças e adversidades, é a prova da sua
força e da sua razão de ser. Correspondendo às mais profundas expectativas
do coração e da razão do homem, a família está na génese da humanidade, na
base da construção da sociedade, e na fonte da sua continuidade.
Escrevi há
pouco em artigo publicado, que olho a família com optimismo, reagindo à
ideia de que está em crise, mas com a consciência do que é positivo e
negativo.
É hoje
irreversível a ideia da igualdade de direitos e dignidade entre o homem e a
mulher, da necessidade de preservar a qualidade da relação interpessoal e a
intimidade conjugal, a sexualidade feliz, a procriação responsável, a
educação e acompanhamento dos filhos, o sentido de colaboração no
quotidiano, a informalidade na aproximação entre todos.
Os sinais
negativos vêem das dificuldades de uma sociedade individualista que se
organiza em torno do efémero, do consumo e do imediato, em perda de valores,
em crise de espiritualidade, descrente do compromisso e da durabilidade do
amor, do sentido do bem comum, sem tempo para parar, reflectir, avaliar.
Sinais
positivos e negativos a gerar contradições, paradoxos e tensões vividas como
sabemos no dia a dia das nossas famílias.
Apesar do
desenvolvimento atingido, o nosso quotidiano tornou-se pesado e desgastante.
Quantas vezes a qualidade de vida é posta em causa... na pressa dos dias...
Como é
difícil (em particular para as mulheres) conciliar a vida profissional com a
vida familiar. Afinal, que realização de vida queremos alcançar?
No meio de
tudo isto, como manter a comunicação, a intimidade, a qualidade da relação
conjugal? Certos da necessidade do amor que sabemos da arte de o preservar?
Que disponibilidade para ter, acompanhar e educar os filhos? A atenção
necessária ao seu quotidiano, da escola aos tempos livres. Às suas
dificuldades. Às suas necessidades, sucessos e fragilidades. Aos gestos
educativos. Ao filtrar daquilo que é transmitido na televisão e proposto
pela cultura dominante. Falar do bem e do mal, de valores, de
comportamentos, de responsabilidades, da verdade, da alegria, de
dificuldades, da esperança, da liberdade, do transcendente... Tempo para os
olhar, tocar, abraçar, brincar, securizar, cantar e sonhar... No fundo...
depois de um dia de trabalho... é nesta capacidade para fazermos este MAIS,
que se joga o futuro!
Família –
unidade de vida de afecto, de fecundidade, unidade social, económica,
cultural, educativa.
Todas estas
dimensões justificam que olhemos a família como a protagonista essencial da
evolução da sociedade. Esta vai sendo o que são ou forem as famílias que a
compõem. Enorme desafio para a sociedade portuguesa, que queremos mantenha e
reforce a estabilidade e o vigor das suas famílias. Só políticas que sirvam
a família, servirão Portugal. Só uma cultura que promova a família trará o
desenvolvimento, o progresso, a estabilidade e o futuro. Só afirmando o
valor da família se respeita a natureza e o destino do homem.
Quanto mais
família, mais humanidade. Quanto mais humanidade, mais família.
No centro
das nossas preocupações tem de estar a família. Não basta dizer que ela é a
célula base da sociedade. É preciso traduzir o que afirmamos em gestos
concretos. Pensar família, agir família. Os critérios pelos quais se tomam
decisões, se pensa a economia e a escola, se constrói a cidade, se organiza
o trabalho e a segurança social, os transportes, a habitação, a saúde e a
cultura têm de ser critérios com rosto humano, que respeitem as famílias, as
coloquem em primeiro plano, as ajudem a desenvolver as suas múltiplas
competências e responsabilidades.
A
Constituição da República Portuguesa reconhece a família como elemento
fundamental da sociedade e considera que é dever do Estado cooperar, apoiar
e estimular o desenvolvimento da instituição familiar, não devendo contudo
substituí-la nas responsabilidades que lhe são e devem ser próprias.
A
Coordenação para os assuntos de família tudo fará para dignificar e promover
a família em sintonia com a orientação do Governo que pretende destacar o
papel essencial da família como espaço privilegiado de realização da pessoa
e da solidariedade entre gerações.
O papel
desta Coordenação será o de assegurar o carácter transversal e integrado das
diferentes políticas sectoriais de incidência familiar. Procurar-se-á
coordenar programas, projectos e acções que reconheçam e valorizem a
importância da família. Serão preocupações desta Coordenação, dentro das
políticas definidas pelo Governo e segundo a orientação próxima do Ministro
da Segurança Social e do Trabalho, elaborar um plano nacional de apoio à
família que dê consistência, transversalidade e orientação às acções que se
querem desenvolver. E destas destacaria:
-O apoio à
defesa da vida, à protecção da maternidade e da paternidade, à infância;
-O papel
insubstituível dos pais na educação dos filhos;
-A ajuda a
famílias em situações de dificuldade;
-A formação
parental;
-O
aconselhamento familiar e a mediação;
-Uma
justiça fiscal eficaz e clara na defesa da família;
-A promoção
da conciliação entre a vida familiar e a vida profissional;
-O
reconhecimento do enorme trabalho social das famílias e em particular das
famílias numerosas;
-O estudo
das razões e das medidas para travar a grave descida da taxa de natalidade;
-A inclusão
do idoso;
-A promoção
da informação relativa a direitos, deveres e ajudas sociais.
Este
trabalho aqui exposto precisa da ajuda e empenhamento de todos. Conto
convosco, com as vossas sensibilidades, opiniões, discórdias, contributos.
Batam-me à
porta, telefonem, convidem-me a visitar as vossas instituições, os vossos
projectos, os vossos trabalhos.
Sabemos
todos que só com as famílias o País se desenvolverá. Elas são a medida da
qualidade do nosso viver. Protagonistas e impulsionadoras da renovação, da
estabilidade, da humanização, da solidariedade, da cultura e da democracia.
Termino com
uma palavra de agradecimento à minha própria família: À de origem, que me
fez existir e onde a vivência entre pais e irmãos tanto de mim determinou. À
que construí e aqui está presente. Terão uma mãe e uma mulher eventualmente
mais cansada, mais ocupada, mais ausente. Sabem as razões porque aceitei
este trabalho e sabem que são no meu coração os meus colaboradores mais
directos. Lembrar-me-ei da solidariedade do meu marido, do apoio e ajuda do
meu filho Tiago e do dedo indicador da minha filha Madalena, que sentindo-se
desde já ameaçada, me recorda várias vezes: “Mãe... na família ninguém é
deixado para trás...”
Muito
obrigada.
Margarida
Gonçalves Neto
Palácio
Foz, 21 de Janeiro de 2003 |